EDITH E OS PRIMEIROS ANOS DA CASA DAS MENINAS

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digitalizar0001As quatro primeiras Servas do Espírito Santo, escolhidas pela Madre Provincial para serem co-fundadoras da Casa das Meninas Nossa Senhora da Aparecida foram:

IRMÃ ÁGUEDA GONTIJO – Mineira, quando veio para Patos de Minas já era idosa. Ficou sendo Diretora daquela Casa. Esforçada, preocupava-se muito com as crianças e muitas das vezes se transformava numa delas. Veio de Juiz de Fora, onde era professora de um Jardim de Infância. Seu primeiro ato como diretora foi fundar o “Jardim de Infância Santos Anjos”. A pedido da Madre Provincial Arnáldia, auxiliei a Diretora na administração, sugerindo o melhor para a Casa, uma vez que conhecia mais o pensamento de nossa gente do que ela, que era novata. Fui secretária da Casa por muito tempo e, acima de tudo, muito amiga de todas as irmãs.

IRMÃ MARIA FELÍCIA SEGER – Era ainda muito jovem, formada em Enfermagem, muito boa, dedicada às crianças, sendo sua monitora. Tinha um rosto e uma alma de criança. Filha de alemães, radicados no Sul, tinha um sotaque diferente que eu gostava de ouvir. Quantas vezes descia o morro com a meninada, levando-as ao médico, dentistas, passeios. Sempre atenciosa, sua saúde era um tanto frágil, o que me deixava preocupada, mas para ela não era empecilho, cumpria seu dever com alegria.

IRMÃ EMANUELA TEIXEIRA – Natural de Carmo do Paranaíba, sempre dizia que era “polivalente”, pois fazia de tudo: bordava, costurava, tricotava, cozinhava, era quituteira das melhores, consertava móveis, lidava na horta, no jardim, na granja. Já estava com seus 80 anos, mas seu espírito era jovem, com bastante iniciativa. Descia pela manhã o morro, com uma cestinha no braço e ia ao Mercado Municipal conseguir frutas e verduras não mais vendáveis. Uma vez tive que zangar com ela, pois tinha medo que trouxesse coisas deterioradas para as crianças, o que seria um desastre.

IRMÃ ALEXANDRINA HOMMES – Era filha de alemães. Jovem, toda eufórica, chegou justamente na época da faxina da casa. Ficou lá apenas 4 meses, mas tempo suficiente para todas terem aprendido amá-la pela sua bondade. Quando foi transferida, despediu-se chorando.

Depois destas quatro irmãs, trabalharam ainda na Casa das Meninas: Irmã Bertrande, Irmã Tomazilda Weise, Irmã Cláudia Maria Baldomar, Irmã Alcina de Araújo.

As Servas do Espírito Santo foram muito generosas e desprendidas. Passaram por pedaços difíceis sem reclamação alguma. Para assistirem à missa, diariamente, nós da Fundação, com nossos esposos que tinham carro (Ângelo, Dr. Ximenes, Sr. Juca Ribeiro) buscávamos o padre às 6 horas da manhã para a celebração. Depois, estava se tornando difícil, devido aos compromissos dos “choferes”, resolvemos alugar um taxi, pagando mensalmente. Mas, começou a pesar no orçamento. Não podíamos comprar um carro. Às vezes ficavam sem missa. Outras vezes desciam a pé aquele morro. Finalmente, Dom José André Coimbra resolveu, com sua bondade, ir ele mesmo celebrar a missa pois tinha como transporte “uma perua”. As Servas também nos deram muita ajuda em dinheiro, móveis, fogão, uma geladeira tipo frigorífico, não recebendo nada de volta, quando deixaram a Casa das Meninas. Nós já tínhamos instalado lá um telefone, facilitando assim as coisas.

Com a vinda das irmãs, já contávamos, no início, com 50 crianças internas. Como neste tempo, trabalhando como chefe de escritório na Coopatos, consegui com os fornecedores de leite uma cota diária para as crianças, aumentada pelo fornecimento, em doação das fazendas dos Srs. Pedro Pereira dos Santos e Lázaro Cunha, situadas perto da Casa das Meninas. O leite era entregue na porta, levado em carroças.

digitalizar0011A Agroceres, sabendo da situação precária da manutenção das crianças, doou à Casa um casal reprodutor de porcos, oferecendo o milho para sustentá-los. As crianças, num futuro próximo, teriam carne para a alimentação. Foram doadas galinhas e pintinhos. Surgiu a granja. Uma grande horta foi plantada sob a orientação da Irmã Tomazilda, que gostava de ver um verdinho brotando da terra. Cada criança tinha e cuidava do seu canteirinho. O pomar já possuía 300 pés de árvores frutíferas. O milho e mandioca subiam e as raízes engrossavam. A Cáritas abastecia a despensa com seus produtos doados: leite em pó, óleo, manteiga, etc.

Começamos com um trabalho de sócios mensalistas. Coube à Fundação conseguir os sócios e a mim fazer a arrecadação. Percorria aproximadamente 900 casas, todo mês, e a renda estava sempre em dia e garantida. O trabalho era cansativo, mas eu tinha a oportunidade de ter um contato direto com o povo, dando-lhe explicações, desfazendo dúvidas, estimulando-os nas contribuições, dando-lhes sempre notícias de como estava o andamento da casa. Foi um trabalho de grande repercussão para a casa. Identifiquei-me tanto com ela que o povo não perguntava pela minha saúde mas: “Como vai a sua Casa das Meninas?

Já nesta época estava grávida de minha filha Myriam, mesmo assim continuava trabalhando, escrevendo nos jornais, fazendo meu programa de rádio, agora em parceria com Dr. Omar Alves Tibúrcio, um velho amigo nosso. Ainda trabalhava na Coopatos, cuidava na minha casa, com o auxílio de minha mãe Zizinha, do enxoval da Myriam, filha que eu esperava com muita ansiedade e amor. Devo ressaltar aqui a paciência de Ângelo para comigo, do seu apoio, da sua ajuda em todos os sentidos, como esposo, como amigo, como benfeitor, chefe de casa e amigo das Irmãs. Foi grande a força que me deu no dia a dia. E sou-lhe eternamente grata e à minha mãe que me ajudou olhando com carinho minha filha, sempre que era necessário.

Lembro-me com saudade, do carinho das Irmãs e das crianças no dia do meu aniversário. Desciam cedo aquele morro e iam lá em casa cantando o “parabéns para você” e me entregando, entre beijos e abraços, uma cesta ora de flores, ora de frutas. Quando me engravidei da Myriam, minha única filha, foi aquela festa. E quando fui para a maternidade, as Irmãs passaram a noite em vigília, rezando para eu ser feliz. E quando Myriam nasceu, às 20 horas, e elas souberam, senti a alegria de todas. No outro dia me visitaram e a Irmã Alcina foi a primeira a tomar Myriam em seus braços. Era dia do meu programa de rádio. Fui substituída pela colega Nilza Batista Neves, que me fez uma bela saudação. Chorei por mim, e por todos, de emoção. Senti o quanto era confortante e valiosa uma amizade sincera. Agora, Ângelo, eu e Myriam fazíamos parte da comunidade da Casa das Meninas de uma forma mais intensa.

No primeiro aniversário de Myriam, ali estavam Irmãs e crianças cantando os parabéns para ela ao redor de uma mesa de doces no aconchego do meu lar, junto conosco, pais, familiares e amigos.

São doces lembranças que a gente sempre guarda com carinho no coração.

O tempo foi passando… passando… As Servas do Espírito Santo, por diversas circunstâncias, alheias à sua vontade, deixaram a Casa das Meninas, o que causou tristeza aos patenses e à Associação de Proteção à Maternidade, Infância e Velhice de Patos de Minas. Isso aconteceu em 1971.

* Fonte e fotos: Do Nascer ao Por do Sol, de Edith Gomes de Deus Melo.

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