COISAS QUE ENVERGONHAM

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MOLATEXTO: DIRCEU DEOCLECIANO PACHECO

Sem qualquer sombra de dúvida, é a Liberdade, uma das condições mais almejadas pelo ser humano e a mim especialmente, é ela de suma importância, daí a repulsa que sempre tive, por tudo que possa tolhê-la ou prejudicá-la.

Desde cedo, sempre repudiei as altas grades e os altos muros, ou estes últimos, encimados por cacos de vidro, a circundarem propriedades, como se todos os que estão de fora, fossem perigosos elementos, prontos a invadi-las.

Sabe-se que entre os povos mais desenvolvidos, é firmado o conceito de que “todo indivíduo é tido como honesto e bom, até prova em contrário”, mas lamentavelmente, entre os brasileiros, parece haver uma inversão total do referido princípio e geralmente são tomadas atitudes que afrontam os bem-intencionados.

De poucos anos para cá, começaram a surgir em nossas ruas, as elevações chamadas “quebra-molas” e sua proliferação foi bastante acentuada, principalmente nas ruas do Bairro Sobradinho – a que, por falta de conhecimento e de amor à tradição, o povo insiste em chamar de Guanabara – até que, sem que se saiba quem determinou a sua implantação, deixaram de ser feitos, por determinação de igual modo desconhecida.

Considero aqueles monstrengos uma afronta à Liberdade e cada vez que sou obrigado a transpor um deles, sinto-me como um marginal que precisa de uma barreira para interceptar sua louca correria e imagino que uma pequena percentagem de motoristas imaturos, ou quem sabe irresponsáveis, obrigam a grande maioria de pessoas corretas e sensatas, a se submeterem ao mesmo vexame.

Tenho a firme convicção de que outros meios menos atentatórios à Liberdade e porque não dizer, mais civilizados, poderiam ser empregados para impedir os desmandos de alguns, como por exemplo, a maior presença do policial de trânsito nos locais mais convidativos à correria, e mesmo porque, para os imaturos e irresponsáveis, aquelas elevações de pouco ou nada valem e o perigo se torna até maior, ante o possível descontrole do veículo que as ultrapassa em velocidade maior.

Há cerca de dois anos, em uma reunião do Conselho Patense de Defesa da Comunidade, em que se fazia presente o Delegado Regional de Polícia que precedeu ao atual e em cuja rua, não sei se por coincidência, foram colocados os primeiros quebra-molas, indaguei sobre a sua legalidade e laconicamente, ele disse “preferir responder com as dezenas de vidas principalmente de crianças, que vinham sendo poupadas graças a eles”. Retruquei que apesar de sua existência apenas em poucas ruas de nossa cidade, não estávamos acostumados a assistir a um massacre geral em nosso trânsito e ficamos apenas nisto.

De vez em quando, esboço meu editorial em torno desse assunto, mas outro mais importante ou de imagem mais positiva surge para ocupar o espaço, entretanto, há poucos dias, no apagar das luzes de 1983, um jovem motoqueiro perdeu a vida ao se encontrar com um daqueles monstrengos. Não discuto e nem conheço as condições em que aquele rapaz pilotava sua moto, como não afirmo que aquele horroroso acessório tenha sido o causador de sua morte, mas fiquei a pensar se tal não poderia ter sido evitado, não fora a existência da elevação no leito da rua e então resolvi expressar minha opinião, para pedir uma explicação sobre a legalidade dos “quebra-molas” e bem assim para solicitar a quem de direito, a procura de um meio mais humano e menos acintoso, para o controle da velocidade.

Ou será que seria melhor voltarmos às esburacadas ruas de meu tempo de infância, onde a poeira ou a lama, impediam aos raros veículos de então, velocidades muito superiores à dos pachorrentos carros de boi, que transitavam por elas em igualdade de condições?

* Fonte: Editorial do n.º 84 de 15 de janeiro de 1984 da revista A Debulha, do arquivo do Laboratório de História do Unipam.

* Foto: Tribunaunião.com, meramente ilustrativa.

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