WAGNER JOSÉ PEREIRA (WAGUINHO) EM 1984

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DSC02004 - CópiaNada mais justo que um papo com WAGUINHO. Afinal, apesar de toda timidez, ele está com a bola toda e cada vez caminhando mais rápido através da musicalidade. Fica dispensada a apresentação; quem quiser saber a biografia completa compre o compacto e leia o encarte. Podem ouvir também, se quiserem; eu particularmente considero uma das boas coisas que ouvi nos últimos tempos. Vamos lá!

Musicalmente, como foi que a coisa toda começou?

Bem, nós começamos mesmo com um conjunto, tocando em bailes, boates, essas coisas. Era um senhor aí da Praça Bandeirantes que tinha uma aparelhagem velha, e nós fomos juntando um, outro, até surgir o conjunto “Formiguinha”.

A idéia foi de quem?

Foi dele. Ele já mexia com música, mas estava parado. Como a gente já tinha uma certa tendência para a coisa, nos convidou. A partir daí nós não paramos mais. Aliás, praticamente fui só eu que aguentei a barra até hoje. Tem o Pelé também que de vez em quando toca num lugar ou outro, mas não levou a música como profissão.

E esse senhor que começou com a idéia?

Ele ainda mexe. Inclusive toca na Lira Mariana. É uma pessoa entusiasmadíssima, gosta demais mesmo. Acho que desse pessoal antigo foi só ele que continuou.

E do conjunto? Vocês desmancharam, acabou ou o que aconteceu?

Eu fui para Belo Horizonte, o conjunto esteve um tempo parado e depois voltaram. Eu estudei música em certa época, mas parei; lá eu estava trabalhando como alfaiate e não tinha muito tempo. Depois voltei e comecei de novo com eles. Mas já não estava dando, a aparelhagem não era muito boa, eu precisava melhorar. Foi onde eu tentei aumentar meu espaço.

Outro dia nós estávamos comentando que uma das épocas fortes da música em Patos, foi o “Canto Chão”. Como foi isso musicalmente para você?

Bom, o “Canto Chão” inclusive poderia ter ficado bem melhor se o pessoal se dedicasse mais à música. Aliás essa foi uma das coisas que me fez sair. Os meninos não podiam ir muito fundo, tinham que trabalhar e tal. Interior é muito difícil de sobreviver com música. Eu não os culpo por isso, o único que estava realmente por conta era eu. Mas era um grupo para se comparar com qualquer um, esse pessoal: “Boca Livre”, “Roupa Nova”. Era só o pessoal empenhar mais na coisa. Valeu demais, demais, praticamente foi o primeiro grupo que eu participei com músicas da gente mesmo. Foi onde me abriu mais a cabeça para esse lado. Antes o negócio era só baile. Isso tudo para mim valeu demais.

E daí você realmente resolveu assumir música como profissão? Como é que foi isso?

Tem mais ou menos uns cinco anos. Eu fui para Belo Horizonte, comecei e decidi que não pararia mais. Fiquei estudando música, depois fiz um testezinho e deu tudo certo, graças a Deus.

Vamos dar uma fugidinha e depois a gente retorna aqui. Lembrei-me de uma coisa interessante que já me contaram sobre você. Todos os dias às seis horas da tarde você canta a Ave-Maria. Como foi que começou isso?

Eu acho seis horas uma hora bonita demais, e uma das músicas que eu mais gosto é Ave-Maria. Isso me dá uma paz enorme. É que um dia em BH eu estava comprando uns papéis em uma loja e uma menina que trabalhava lá começou a tocar a música no piano. Eram seis horas e o pessoal me disse que ela fazia isso todos os dias. Mudou o clima do trabalho. Eu achei tão bonito e pensei que todo mundo devia fazer isso. Aí eu comecei e não parei mais. Só parei hoje por causa da entrevista, mas sempre eu canto.

Isso também está ligado com o seu lado religioso?

Acredito que sim. Eu acho que Deus é tudo, é primeiro lugar. Agora em religião, cada um escolhe a que quiser, desde que tenha Deus como base. Como religião para mim tanto faz uma coisa ou outra, mas uma das coisas que eu mais respeito e admiro, que está acima de tudo é Deus. Ele faz o que bem quiser de mim. Eu gosto de música, mas é Ele quem sabe se eu devo ou não continuar.

Isso surge no seu trabalho?

Nem sempre. Mas eu procuro sempre levar alguma mensagem de otimismo. Sempre tento levar uma mensagem boa para as pessoas. Se eu pudesse só me envolver com esse tipo de trabalho, seria bom.

Retornando a história toda, em BH você começou com quem?

Células. “Banda Células”. Fiquei mais ou menos uns oito meses, depois foi o “Pactus” que era um conjunto de maior estrutura e que além de fazer bailes em fins de semana, tocava em boates no meio de semana, dando uma boa tarimba para a gente. Fiquei mais ou menos um ano e tanto no “Pactus”. Depois fui para o “Samanthas” em Divinópolis, de lá voltei a Belo Horizonte e comecei a tocar no restaurante Barretos em Pirapora. Aí voltei para Patos para o show “Vinícius, o Poeta do Amor”.

Você veio só para o show?

Comecei a vir, ensaiar e voltar. Aí eu fui me entusiasmando com o negócio e para parar com esse prá lá e prá cá, essa confusão toda, eu resolvi dar um tempo por aqui mesmo. Fui ficando e estou aí até hoje.

E aí, dessa “chegada”, de todas essas andanças e lutas, surgiu o disco? Isso era uma coisa que você estava esperando ou foi um repente?

Bom, eu realmente já estava com a idéia. De uma forma geral eu sou muito devagar para as coisas, mas disco é sempre algo que todo mundo deseja; todo mundo que está ligado com música, é claro. A vinda ajudou muito, o João Marcos, o Xaulim, o pessoal acreditou na possibilidade de um disco, no meu trabalho, e a gente fez a coisa.

E agora? Você divide sua vida musicalmente como antes e depois desse disco, ou foi simplesmente mais um passo?

Eu acho que sem dúvidas foi muito importante para mim. Facilitou demais e melhorou muito. Eu acho que abriu um espaço enorme, mas não acredito que isso seja tudo. Facilita muito, isso sim.

Dentro de Patos, ou a coisa é geral? Como é que anda a divulgação do trabalho aí fora, você tem alguma notícia?

Parece que vai muito bem. Em Brasília eu sei que está tocando bastante, e BH também. Aqui a coisa vai direto, o pessoal continua dando a maior força. Agora, em outras cidades não dá para saber, nós não mandamos disco, nem nada. Mas estamos prontos para levar o trabalho.

Só um compacto simples? A estrutura é maior que isso? Você acha que daria para segurar um LP, por exemplo?

Eu acho que sim. Aliás, acho não, eu tenho certeza. Acontece que um LP independente, é uma coisa muito difícil; pagar studio, a prensagem do disco, o preço de uma orquestra. É claro que ia precisar uma orquestra, em certas músicas; tudo isso fica muito caro. E para fazer algo pela metade, eu acho que não vale a pena. Eu tenho estrutura para fazer um LP, mas no momento, não tenho estrutura financeira. Não vale a pena.

Então não é uma coisa que te preocupa?

No momento não. O dia que eu puder fazer um LP bem feito, que eu puder usar uma orquestra e tiver tempo para studio, dinheiro para me manter no studio, aí tudo bem.

O studio foi uma primeira experiência, não foi? O que é que você encontrou como maior dificuldade nisso tudo?

Foi uma experiência nova para mim. Mas o que eu acho que foi dificuldade, foi o nervosismo, a gente preocupada com o tempo, o dinheiro medido, essa loucura toda. Dá para ficar apavorado. Depois você vai chegando nos lixos, vai sentindo que não resolve essa correria toda, essa impaciência, porque o tempo é aquele mesmo e vai ter que gastar aquilo. Bom ou ruim vai ter que fazer. É uma experiência desagradável mas de qualquer forma a gente se apega a ela.

E o resultado, foi o que você pretendia?

Eu acho que o disco saiu razoável. Não quer dizer que está ruim, o pessoal tem gostado, a qualidade do som não está ruim, mas não é como eu queria. Eu quero ter mais tempo para fazer um negócio perfeito. Acho que atingi uns 80% do que eu queria.

Em Patos nós sabemos que está tocando muito bem, mas o que é que você tem ouvido por aí?

É uma coisa interessante. O pessoal de Patos tem a mania de gostar, bater palmas, mas na hora de ajudar mesmo, pouca gente quer. Realmente a música tem tocado muito, são mil elogios, mas não está vendendo como a gente esperava. Por incrível que pareça, está vendendo mais fora que aqui. Em Brasília, por exemplo, em pouco tempo que nós estivemos lá, vendeu muito mais do que aqui. O pessoal sempre fica numa de que: se ele está por aqui mesmo, amanhã a gente se encontra em um boteco e ouve ele tocando de graça. Bom, deixa para lá.

Vai dar lucro, Waguinho?

Isso é com o pessoal da FUCAP. Eu acho que não vai dar prejuízo, porque nós temos muita gente dando força por aí.

O compacto é específico regionalista, urbano, ou algo assim?

Não. A música que está tocando mais é bem regionalista, mas em compensação o outro lado é demais urbano. Uma coisa completamente inversa.

Foi proposital isso?

Foi um pouco. Isso é para o pessoal sentir que eu não sou nem uma coisa nem outra.

Então, depois de mil andanças, um compacto na praça e tudo mais, você não se define musicalmente?

É meio difícil dar uma definição por isso tudo. Eu passei por bailes, praticamente mais de dez anos e aprendi a tocar de tudo. Meu estilo seria uma síntese disso tudo. Eu não tenho uma definição exata em relação a se a música é regional ou urbana.

Mas profissionalmente você a defini como música, não é mesmo?

É isso aí, minha profissão é música, com carteira registrada e tudo mais. É claro que com as minhas deficiências, afinal não existe um músico completo. Eu estou lutando para ser bom mesmo, mas a gente é cheio de deficiências. Eu cheguei à conclusão, por exemplo, que sou mais vocalista; no entanto, adoro instrumento. A voz é que sobressai mais. Eu comecei tocando guitarra, depois violão, no fim já era contra baixo e agora estudo piano. Quer dizer, não vou ter condições nunca de ser um bom instrumentista. Agora, a minha preocupação maior é ser um arranjador futuramente, e não chegar a tocar um instrumento divinamente. Minha preocupação é com o geral.

Para quem sempre tocou música dos outros em bailes, essa condição do compositor, surgiu como uma necessidade para complementar o trabalho ou você já compunha antes?

Eu acho que a composição começa com a inspiração, onde há uma necessidade de mostrar alguma coisa. Comecei mostrando umas coisinhas que eu já tinha feito e fui crescendo de acordo com a aprovação do pessoal. Como é como estudar, a gente cada dia mais vai aprendendo alguma coisa. É sempre um aprender. Quanto mais a gente compõe, mais aprende a fazer a coisa. É tipo uma escola mesmo.

E letrista, você assume? O Woodson, como é que entra nessa história de parceria? Ele me parece um excelente comparsa.

Bom, em letra eu chuto. Eu não sou bom letrista, minhas letras são coisas simples, mas dizem a música que eu quero. Quanto ao Woodson, ele anda meio parado, o tempo meio curto. Eu estou compondo mais do que ele, minhas últimas músicas estão sem parceiro, mas eu ainda pretendo ter um parceiro bom de letra. É o que eu mais estou sentindo necessidade no momento.

E isso que você vem fazendo de complementar um show poético teatral, “Vinícius”, “Trenzinho Sonhador”, como é que encaixa no seu “Curriculum Vitae”?

Eu acho que isso complementa o meu trabalho, faz com que eu mostre uma coisa diferente do que eu ando vendo atualmente. Eu acho que realmente é muito válido para mim. Eu adoro fazer um trabalho diferente.

Mas aí já é diversificar demais. Deixa ver se nós entendemos. Vamos começar pela noite, é porque você gosta mesmo ou é solução?

Não, acontece que em shows eu estou começando agora e é muito difícil, para a gente começar de cara e sobreviver. Eu estou tentando aumentar o espaço das minhas músicas mesmo para um dia eu poder tocar só coisas minhas.

Agora vamos para a questão do gosto. Sem estilo para fazer as coisas, o que é que você ouve normalmente?

Clássicos. Eu não toco nada de clássicos, mas gosto demais de ouvir. É a única coisa que eu tenho paciência para sentar e ficar horas ouvindo. Gosto muito de jazz, popular brasileira, mas música às vezes machuca. Talvez seja impaciência ou uma questão de sensibilidade, sai lá…

E grupo. Ainda existe a possibilidade de trabalhar com um grupo ou você prefere continuar sozinho?

O negócio de grupo é o seguinte: só se tiver umas quatro cabeças que pensam a mesma coisa, com a mesma idéia, o mesmo empenho. Eu acho meio difícil. O trabalho individual às vezes é melhor, sacrifica-se mais um lado mas vale mais a pena. Grupo é possível: depende da cabeça do pessoal.

Mas você quase saiu de Minas, Rio ou São Paulo, não teve alguma coisa assim, em cima de um grupo?

É, pintou a idéia. Era inclusive um pessoal mais velho com um maestro inclusive: para tocar na noite, jazz, blues, coisas que eu até gosto muito. Ai. Sabe como é que é, eu sou muito é acomodado.

Você prefere mesmo é continuar um trabalho de defender o “pão de cada dia” é isso?

É. Se for aumentando tudo bem, mas sem aquela agonia de ficar procurando produtor, etc. As coisas tem que acontecer naturalmente. É bom saber que seu trabalho está sendo reconhecido. Mas uma coisa que eu prezo demais na vida é sossego e tranquilidade. Inclusive o disco. Se aparecer alguma pessoa de nome que ouvir e gostar, tudo bem. Mas sair procurando?… Se algum dia tiver que acontecer eu quero que o pessoal sinta que vale a pena, o próprio povo. Não precisa de medalhão para me dar força. Existem pessoas que eu sei que estão me dando uma força enorme. O pessoal que está começando comigo, a FUCAP. Agora procurar pessoas que já estão lá em cima, ficar debaixo da asa, eu não gosto desse tipo de coisa. Se tiver que acontecer é porque realmente merece acontecer, tem valor.

Essa tranquilidade, esse bom senso te ajudaram para que as coisas corressem mais depressa?

Não, eu acho que não. Tem pessoas que às vezes não tem condições e batalham até conseguir; e rápido por sinal. Eu acho que é uma coisa mais demorada, mas com um detalhe: o que for acontecendo vai tendo uma certa segurança, sem ser fabricado. Se a coisa for acontecendo, tudo bem. É porque eu realmente mereço. Se não acontecer, deixo para quem merece.

É claro que foi uma coisa muito forte. Mas sem considerar a gravação do disco, você acha que musicalmente, sua melhor fase é agora?

É. Sempre eu acho que é o presente – Espero que daqui a dez anos eu esteja bem à frente disso. A partir do momento em que resolvi viver de música, eu tive que dar conta do trabalho, fazer um bom trabalho. Eu assumi a coisa, aprofundei, mas estou e vou estar sempre estudando. Ultimamente é que eu ando meio preguiçoso, meio cansado, mas assim que eu voltar para Belo Horizonte…

Você vai embora, Waguinho?

Não. Eu estou pensando em ir para BH, nos fins de semana, mas no meio da semana eu quero estar aqui. Eu não quero ficar longe. Vou continuar a dar minhas aulas e pesquisar um pouco do trabalho. Lá só para o fim se semana, já que aqui infelizmente a gente não tem opções, e um ou outro dia para dar uma estudada, aprofundar um pouquinho.

Apesar das poucas condições profissionais aqui em Patos, como é que você vê essa explosão cultural que aconteceu por aqui? Isso é uma coisa indiscutível principalmente no meio musical, concorda?

Eu não sei. Patos é o seguinte, um lugar onde tem muita gente boa precisando de incentivo. Atualmente, tem por exemplo a FUCAP, que tem dado um apoio maior aos artistas patenses. Fora daqui existe um respeito muito grande pelos artistas da região, e isso faz com que todo mundo cresça, queira batalhar, cada um achar um lugar ao sol. Antes até que o pessoal tinha o direito de reclamar, mas hoje com a FUCAP e a Casa de Cultura dando apoio, o músico tem é que se vangloriar. Eu por exemplo não estou aqui de bobeira não. Sai de BH, apesar de bons ordenados, lugar para tocar sempre e vim para cá. Eu estou sentindo que a coisa vai crescer e surgir muito daqui. Agora, a coisa deve ser levada também muito a sério. O pessoal que está começando, quando for sentindo a barra da coisa, a música como profissão, vai pensar diferente, procurar novos caminhos e encarar com maior responsabilidade.

Você também teve essa idéia inicial de que iria ser “Chico Buarque” algum dia, quando começou?

Todo mundo tem vontade, mas eu acho que a coisa só pode acontecer a partir do momento que a pessoa tem confiança. Eu acho que para a gente acontecer tem que acontecer e segurar as pontas. É o caso de muitos músicos que chegam, estouram e depois não têm estrutura para segurar aquilo. A partir do momento que se fez sucesso, se não se segurar talvez não aconteça de novo. Para estourar é uma dificuldade danada, agora duas vezes é um caso para um músico e tanto. Eu prefiro esperar mais, amadurecer na coisa, porque se algum dia a coisa for acontecendo eu vou segurando a barra. Eu acho que se todo mundo pensasse assim, muita gente talvez não teria certas decepções que tem.

Apesar de toda essa explosão cultural, dá para notar que o nível dos festivais por aqui vem caindo muito. O que é que você acha disso?

Eu não gosto muito de festival. Eu só assisti e participei como jurado do último FEPAMI e do FECEMI. Pelo que eu vi há muito tempo atrás, eu acho que caiu demais mesmo. Sem querer malhar o FEPAMI, o festival do Colégio Estadual (FECEMI) quase se equiparou a ele. Bom, mas eu acho que isso é geral no país inteiro. O pessoal ultimamente só anda ouvindo porcarias, e os bons músicos não entram nessa. As multinacionais estão acabando com a MPB. Os festivais estão um absurdo. Eu não concordo por exemplo com festival de música popular brasileira, ter gente tocando rock, jazz, blue, coisas que não são nossas. Eu gosto deste tipo de música, mas festival de MPB tem que ser música de raiz. A decadência começou com esse “Shell” e veio influenciando até no interior.

E essa entrada de “sola” do Kid Abelha, Blitz, Barão Vermelho, como é que você vê essa tomada de consumismo?

Isso é moda. Eu acho simplesmente uma moda, mas acho que é legal na hora do consumo. Não é que eu não goste, tem muita coisa boa para se ouvir, achar engraçado, mas não é um trabalho para gente cultivar. É tipo coisa descartável, mas é válido. O país quando está em crise não têm condições de fazer bons trabalhos, uma coisa pesquisada. Tem que jogar de tudo, tem que tentar de tudo. Tem músicos que seguram a barra e não entram nessa.

Mas esse pessoal que não entra na deles fica com uma dificuldade muito grande para divulgar um trabalho, não é isso?

Fica, realmente fica difícil. Mas é preferível não se prostituir na música. Ter maiores dificuldades nas coisas mas não bagunçar. Se mais gente firmar o pé daqui uns dez, quinze anos o brasileiro vai ter criado um bom gosto. Eu acredito na cultura do país, porque depois de se ter uma tendência cultural ninguém se abre à toa, não se vende por qualquer coisa. É onde esse pessoal vai segurando a barra, e nisso vão entrando outros. Esse pessoal de consumo, essas músicas descartáveis, faz hoje e amanhã. Aí tem que partir para outro tipo de trabalho. Deu certo só aquela vez.

Então qual a saída para quem quer viver de música atualmente como você vem fazendo? Pastar muito?

Eu acho que para gente pastar, é o seguinte: quando se quer conseguir uma coisa de todo jeito, que quer batalhar, tem que pastar mesmo. Mas no meu caso que não estou preocupado muito com a coisa, vou deixando acontecer eu acho que se pasta menos. Se a pessoa se prostituir na música é mais fácil sobreviver, ficar feito folha de bananeira indo para onde o vento soprar. O bom é fazer isso, é isso que está vendendo, esse tipo de coisa. Agora no caso do músico que zela pelas raízes já é mais difícil. É difícil, mas ou você se vende e tenta alguma coisa boa e independente, ou então fica sem-vergonha e entra na deles.

E assim o trabalho vai sendo levado de show em show, né? Tipo o da apresentação do disco em Brasília, daqui um tempo em BH; como é que estão andando as coisas em cima do palco?

Em Brasília o pessoal gostou demais, foi praticamente o primeiro show que fizemos e parece que a repercussão foi ótima. Principalmente lá na FUNARTE, o pessoal de lá dentro mesmo assustou com o negócio. Eu acho que foi um bom show. É difícil dizer porque você não está lá embaixo para sentir a coisa, mas agradou. A imprensa também comentou muito, a divulgação foi enorme, até exagerado. Só para você ter uma idéia eu comecei a comprar jornal e não estava dando conta de tudo. Era o dia inteiro comprando jornal para recorte, prá guardar de lembrança e depois mostrar para os netos. Já em BH, a coisa vai acontecer no Projeto Fim de Tarde do Palácio das Artes. São três dias, uma quarta, quinta e sexta (22, 23 e 24 de agosto).

Em Brasília e lá em Belo Horizonte, o pessoal que vai participar é o mesmo da gravação do disco?

A intenção é essa mesmo. Eu não gosto de mudar de músicos e estou muito satisfeito com o pessoal. Quanto mais tocar junto, maior o entrosamento. A produção também é a mesma, fica tudo por conta do Xaulim já que é pela FUCAP e ele é o diretor artístico. TUDO isso que está acontecendo é pela FUCAP.

O que é que você acha básico para a estruturação de um show?

A responsabilidade em primeiro lugar. Ensaio. E saber que o pessoal vai lá para ver os defeitos. O negócio é tirar as máscaras e não querer satisfzazer a gente e sim quem foi lá para ver o trabalho. O negócio é empenhar no que vai fazer, ter responsabilidade e fazer que está ali para agradar o pessoal que pagou e quer ver uma coisa boa. Neste país tem muita coisa boa, você tem que tentar se não superar, pelo menos fazer uma coisa de um nível igual.

Você acha que um tamborete e um violão fazem um show?

Acho, uai! Até um violão sozinho faz show, um tamborete ajuda mais ainda, principalmente se tiver um para sentar e outro para tocar. Agora, no violão o recurso é pouco, isso considerando o show em si, é claro; então, a pessoa tem que se desdobrar na coisa. Tem que ter uma boa estrutura, mas é possível. Um dos shows que eu mais gostei até hoje foi o do Elomar e o violão dele. Já assisti shows de conjuntos, orquestras e às vezes agradei mais do show do Elomar.

Você começaria tudo de novo do mesmo jeito, com baile e tudo?

Talvez. Tocar em baile foi uma ótima experiência que eu tive, valeu demais. Atualmente eu não gosto fr fazer baile, mas acho que todo mundo deve passar pelo que eu passei para sentir como é realmente a música. Sair por aí tocando, aprendendo, passando um pouco de trabalho. Isso para não achar que música é coisa do mundo não se entusiasmar a toa. Música é uma profissão muito difícil tem que gostar demais e ter muita paciência. Investimento a longo prazo.

Antes de encerrar, só uma saideira. Você nasceu em Campos Altos, nós sabemos. “Cê é patureba”?

Sou. Eu nasci lá e vivi 3 anos. Acho que nem vivi, a família esta numa situação difícil, numa época “braba”, e eu fiquei três anos. Tudo começou mesmo foi aqui, inclusive minha carreira musical. Tudo saiu daqui, o que está acontecendo agora foi por causa da minha vinda prá cá.

Agora para terminar.

Bom eu quero agradecer a vocês essa oportunidade, e aproveitar e agradecer ao pessoal da FUCAP, que nessa confusão a gente nunca chega e diz um muito obrigado. Agradecer a todo mundo, desde a Terezinha, nossa faxineira, ao presidente, o João Marcos. Obrigado.

* Fonte: Entrevista de João Vicente Deocleciano Pacheco e Dirce Djanira Pacheco publicada na edição n.º 97 de 15 de agosto de 1984 da revista A Debulha, do arquivo do Laboratório de História do Unipam.

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