TORTURA DO SILÊNCIO, A

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ATEXTO: RAFAEL GOMES DE ALMEIDA (2015)

Antes de mais nada, quero confessar que não estou voltando ao jornalismo, onde parei em maio de 1988, porque os meus artigos eram criticados e muitas vezes por telefonemas anônimos que ameaçavam até a minha família.

Mas agora, quando Patos vive uma situação crítica socioeconômica e administrativa, vou rememorar um artigo escrito em 1970:

Naquela época Patos já começava a sentir o drama da pobreza, pois as grandes empresas se transferiram para Brasília e outras capitais, e nós continuamos em insistir que Patos é uma cidade pólo, quando na verdade é uma cidade depósito.

Todo mundo critica as falhas existentes, mas não aparece ninguém para oferecer uma solução.

O artigo publicado em 1970 fez com que o Dr. Rubens Soares, juiz de direito da Comarca de Patos de Minas, falecido recentemente, e que estava assumindo a sua função naqueles dias, me telefonou pedindo para marcar um horário, porque queria conversar comigo.

Retruquei que ficava muito honrado, mas preferia que ele marcasse um horário que eu iria conversar com ele, pois tratava de assunto de interesse da cidade, e não seria justo que ele viesse a mim, sendo mais lógico que eu fosse a ele, pois ele era bem mais ocupado do que eu.

Marcado o encontro eis que eu deparo com o juiz recém chegado e o promotor de justiça Dr. Paulo Mendes que queria saber os detalhes do meu artigo.

Expliquei que os passeios da Rua Major Gote, da Recreativa ao Edifício Alvorada e do Magnífico Hotel às portas do Bando do Brasil eram intransitáveis porque mendigos se assentavam nos mesmos com crianças de colo jogadas no chão, enquanto, se valiam de conseguir algum dinheiro.

No entroncamento das Ruas Major Gote e Olegário Maciel o trânsito também era intransitável pois tinha mais de 20 (vinte) carros expostos a serem rifados com finalidade de ajudar entidades de utilidade pública ou esportivas sem precisar de autorização do Ministério da Fazenda.

Tomei cuidado e por amostragem pedi o endereço de 10 (dez) mendigos e fui as entidades de caridade para saber a realidade.

Para meu espanto 90% (noventa por cento) dos mendigos alugavam crianças para chamar a comiseração humana e as rendas para as entidades de utilidade pública eram de fachada, pois os cambistas usavam o nome das entidades fazendo uma doação miserável para ter os dados para inserir nos bilhetes de rifa.

Sugeri que se juntassem todas as entidades de classe de Patos para criar um conselho de defesa da comunidade para fazer uma limpeza nesses escândalos perto dos escândalos que acontecem em Patos de Minas.

O juiz me perguntou se eu aceitava enfrentar este problema e eu respondi se o senhor for o presidente e o promotor for o vice-presidente eu quero ser o secretário.

Ele mandou que eu fizesse o estatuto e comunicou com todas as entidades de Patos e com uma meia dúzia de soldados que aqui vigiavam a cidade, além de avisar a Rádio Clube de Patos, o Jornal do Município e a Folha Diocesana, os únicos órgãos de comunicação existentes na cidade, para explicarem a nossa intenção: Varrer a cidade para que ela pudesse respirar.

Na primeira reunião o estatuto foi aprovado por unanimidade e não estávamos criando um problema, mas oferecendo soluções para os problemas.

O então prefeito, meu amigo e companheiro, Sebastião Silvério de Faria colocou a assistência social à disposição da comunidade recém criada e imediatamente entrou em contato com as empresas de ônibus para que os pobres que não fossem de Patos, tivessem passagem gratuita para o retorno a sua cidade de origem.

Limpamos a cidade dos cambistas e a Major Gote ficou livre para o passeio.

Era uma atitude que somente poderia ser tomada tendo a frente o poder judiciário, porque o político tinha medo de perder o voto e a sociedade que tanto acusava não tinha coragem para enfrentar o problema.

É hora de termos agora não Conselho de Defesa da Comunidade, mas um Conselho de Defesa Regional, porque o grande problema é que quem vem buscar socorro médico dos
municípios vizinhos não tem o retorno garantido pelo município de origem e se torna homens de rua, fazendo de Patos um verdadeiro depósito de problemas que o povo de Patos chama de cidade pólo da saúde.

Vêem o bom mais fecha os olhos para o que acontece de pior.

Este problema não é para ser resolvido pelas autoridades, muitas vezes comprometidas, mas o povo de Patos de Minas tem que acima de tudo, assumir o compromisso com a nossa cidade para que ela se torne a cidade dos nossos sonhos, para que possamos acordar do pesadelo.

* Fonte: Texto publicado na edição de 14 de março de 2015 do jornal Folha Patense.

* Foto: Pjalencar.blogspot.com.

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