DA DOAÇÃO DO PATRIMÔNIO À CRIAÇÃO DO DISTRITO

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Antônio Joaquim da Silva Guerra, comerciante, e dona Luzia Corrêa de Andrade, sua esposa, foram os doadores do terreno no qual está situada parte da cidade de Patos de Minas. A doação, ao glorioso Santo Antônio, é datada de 19 de julho de 1826¹.

Quando foi feita a doação, “Os Patos” caminhava para ser uma Aplicação (povoação em seus primórdios). Os patenses dependiam, tanto judicialmente quanto no espiritualmente de Sant’Anna da Barra do Espírito Santo, atual Santana de Patos, elevado a distrito em 15 de outubro de 1827, onde se encontrava o juiz de paz e, também, a autoridade eclesiástica que lhes dava assistência espiritual. De acordo com um censo realizado oito anos após a doação, por ordem do Ouvidor Melo Franco, eram 411 brancos, 260 pardos livres, 29 pardos escravos, 6 pretos livres e 100 pretos escravos, dando um total de 806 habitantes.

O “Livro da Câmara do Paracatu” (página 54 – ano 1824 – APM) traz um comunicado ao governo, do ouvidor Antônio Paulino Limpo de Abreu, sobre a visita pastoral feita em 1824 a Paracatu, informando, a determinada altura, que “depois de longa e penosa viagem, em 1824, o sr. Bispo de Pernambuco visitou todas as povoações da Comarca de Paracatu”. Confiando na veracidade da informação, somos levados a admitir que a povoação “Os Patos”, bem como a aplicação de Sant’Anna da Barra do Rio Espírito Santo, receberam a visita daquele prelado. E de maneira alguma, passaria desapercebido ao ilustre visitante o número de habitantes da povoação, sem uma ermida ou assistência espiritual imediata. Teria o Bispo influído na decisão de Antônio Joaquim da Silva Guerra, de legalizar a ocupação das terras, acomodando os povos? Silva Guerra viveu poucos anos mais, depois da histórica doação.

O edital baixado pela câmara de Paracatu em 17 de janeiro de 1832 criou o distrito de Santo Antônio da Beira do Paranaíba, que passou a ser o nome da antiga povoação “Os Patos”. Aqui, cabe um esclarecimento. Por decreto de 13 de outubro de 1931, o Julgado São Domingos do Araxá foi elevado à Vila. Mesmo com Julgado, sua jurisdição abrangia Sant’Ana da Barra do Rio Espírito Santo, e, portanto, a povoação “Os Patos”. Quanto ao município, o território pertencia ao de Paracatu, a cuja Câmara cabia legislar sobre o mesmo. Embora criada em 1931, a Vila de Araxá só foi instalada a 7 de janeiro de 1933. Em resumo, o Julgado não tinha Câmara, portanto não podia legislar. Assim, até a instalação do município araxaense, Santo Antônio da Beira do Paranaíba ficou obediente a Paracatu. Depois, de 1833 a 1840, a Araxá.

Para criação do distrito, os povos da Capela de Santo Antônio da Beira do Paranaíba fizeram um requerimento à Câmara de Paracatu, com base no decreto de 11 de setembro de 1830, que declarava ser da atribuição das Câmaras Municipais dividir e demarcar distritos, e comprovaram que a Capela tinha um Cura, dando ainda os elementos necessários para a divisão distrital. Aliás, um dispositivo do artigo 55, da lei de 11 de outubro de 1828, já dava plenos poderes aos legislativos municipais para fazerem divisões e demarcações de distritos. O citado edital marcou dia para a eleição do Juiz de Paz e Suplentes – os primeiros – 13 de fevereiro de 1832. O Juiz de Paz da Vila de Paracatu contestou a divisão feita pela Câmara, junto ao Conselho da Província. A 30 de dezembro de 1833, a Comissão de Representações do conselho emite o seu parecer: “que nenhuma dúvida podia ocorrer a respeito do direito das Câmaras para dividirem os seus termos em distritos, e para nele fazerem criar Juízes de Paz, contanto que tivessem o número de 75 fogos²”.

Outro favorecimento aos habitantes do lugar foi a decisão imperial de 11 de fevereiro de 1829, que determinava: “Se devem haver por Capela filiais Curadas todas aquelas que tiverem Aplicados, e em que se administrarem os Sacramentos, regular e constantemente, ainda que os capelães sejam unicamente postos pelos Párocos ou pelos mesmos Aplicados com sua licença”. Nossos antepassados, com base na referida decisão, conseguiram do Cura de Sant’Anna da Barra do Espírito Santo, Thomé Ferreira Souto, a contratação de seu coadjutor, Padre José de Brito Freire e Vasconcelos, para sua assistência espiritual e para orientar a construção da capela de Santo Antônio. O padre assistiu aos paranaibanos até 1839, quando rumou para Paracatu, deixando em seu lugar, ainda como Cura, seu parente Padre Manoel de Brito Freire, o qual, depois de perseguido pelo bispo Perdigão, de Pernambuco, consegue sua ordenação sacerdotal através do bispado goiano. Manoel de Brito Freire, por onze anos, ainda se manteve às expensas dos moradores. Durante 20 anos os dois padres foram pagos pelos habitantes. De 1831 a 1839, o padre José de Brito Freire e Vasconcelos, e de 1939 até ser provisionado, o padre Manoel de Brito Freire.

Em 1836, o Juiz de Paz do distrito, Antônio Netto Carneiro Leão, informa ao governo a situação da indústria e do comércio em Santo Antônio da Beira do Paranaíba: apenas quatro engenhos movidos a boi, pertencentes a Francisco José de Magalhães, Francisco Fernandes Lopes, Felix Francisco Machado e José Alves de Araújo. As casas que “uzão de vender águas-ardentes simples e negociam os mais diversos artigos (tabernas) são de Felipe Alves de Carvalho, Ana Gomes, Maria José, Luzia Corrêa de Andrade (esposa de Antônio Joaquim da Silva Guerra, o doador do patrimônio), Felisberto José da Fonseca, Tomaz de Aquino Nunes, José Nicolau Alves Diniz, João Ferreira do Prado e Adão Nepomuceno”. Termina informando que “no prezente não se conta loja alguma de fazenda seca, e vendem espíritos (bebidas) importadas da Província: Felipe Alves de Carvalho, Tomaz de Aquino Nunes, Luiz Corrêa de Andrade e Felisberto José da Fonseca”.

* 1: Leia “Escritura de Doação Feita Por Silva Guerra e Sua Esposa”.

* 2: Em 1825, o presidente da Câmara de Paracatu esclarecia: “Tendo de remeter à Secretaria de Estado dos Negócios da Justiça um mapa estatístico contendo o número de Vilas, Julgados e Povoações desta Comarca, e os fogos de cada uma delas, devendo nesta última parte que vosmicê me envie quanto antes um mapa particular, que declare quantos fogos existem neste Distrito de sua jurisdição; parecendo-me conveniente esclarecer-lhe que a palavra – Fogos – quer dizer casais ou famílias, que vivem em casa separada debaixo da direção de um chefe, ou pai comum – para que não suceda confundir-se, julgando que exijo alguma relação numérica de pessoas, como continuam a remeter-se em designados tempos ao Capitão Mor do Termo. Deus Guarde a vosmicê muitos anos. Vila do Paracatu do Príncipe, 25 de junho de 1825 – Ao sr. Comissário do Distrito do Arraial de São Domingos do Araxá, Jerônimo José da Silva

* Fontes: Domínio de Pecuários e Enxadachins, de Geraldo Fonseca, e Patos de Minas: Capital do Milho, de Oliveira Mello.

* Foto: Parte da folha 1 da Escritura de Doação, do livro Uma História de Exercício da Democracia – 140 anos do Legislativo Patense, de José Eduardo de Oliveira, Oliveira Mello e Paulo Sérgio Moreira da Silva.

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