JOSÉ DE BRITO FREIRE E VASCONCELOS: O PRIMEIRO CURA

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PADREO distrito de Santo Antônio da Beira do Rio Paranaíba teve dois Curas¹. Os padres José de Brito Freire e Vasconcelos, de 1831 a 1839, e Manoel de Brito Freire, de 1839 a 1850². Criada a Paróquia de Santo Antônio dos Patos (novo nome do lugar) a 31 de maio de 1850, o padre Manoel de Brito permaneceu à frente da mesma, como pároco encomendado.

O Curato³ de Santo Antônio da Beira do Rio Paranaíba é bem configurado pela decisão imperial de 11 de fevereiro de 1829, quando determina: “Se devem haver por Capelas filiais Curadas todas aquelas que tiverem Aplicados4 e em que se administrarem os Sacramentos, regular e constantemente, ainda que os Capelães sejam unicamente postos pelos Párocos ou pelos mesmos aplicados com sua licença”.

José de Brito Freire e Vasconcelos veio de uma família cujo tronco está assentado na Bahia, com Estevão de Brito Freire, português de origem distinta, casado a 10 de agosto de 1592 com dona Violante de Araújo. Da Bahia, os Brito Freire espalharam-se pelo Nordeste. Notadamente em Pernambuco, capitania que chegou a ser governada, de 1661 a 1664, pelo Almirante Francisco de Brito Freire. Com as entradas dos pernambucanos na região paracatuense, chegaram os Brito Freire. Em documentos do início do século 19, encontramos o nome do padre José de Brito Freire, homônimo do que objetivamos.

O primeiro Cura de Santo Antônio da Beira do Rio Paranaíba nasceu em 1806, filho de Florência Maria de Sant’Ana, natural de Paracatu (Assentamento da Irmandade de N. S. do Rosário dos Pretos, de Paracatu). Em 1820, os moradores do Julgado de Nossa Senhora do Desterro do Desemboque, então anexado ao território de Minas Gerais, pedem ao Governo “instrução da mocidade, sendo esta naquele Julgado, não só numerosa, senão a maior destituída de meios de educação, pois que nem se lhes pôde manter uma cadeira de primeiras letras, que ali fora estabelecida pela Província de Goiás, a que já estivera aquele Julgado anexo”. Este é um trecho de pedido encabeçado pelo vigário Hermogenes Cassimiro Brons Wilke, de Desemboque, que indica para ocupar o lugar José de Brito Freire e Vasconcelos, pessoa cuja probidade atestavam os suplicantes.

Não sabemos por quanto tempo José de Brito Freire e Vasconcelos, então com 14 anos de idade, lecionou em Desemboque. O contato com o vigário Brons Wilke, cuja inteligência é amplamente reconhecida por vários pesquisadores, deve ter sido bastante proveitoso ao jovem mestre. Regressando a Paracatu, José entra para a Aula Prática de Gramática Latina, regida pelo professor João Gaspar Esteves Rodrigues, que lança em um dos seus boletins: “José de Brito Freire e Vasconcelos – branco – Traduz Selectas e Ovídio”.

A escassa documentação existente em Recife e Olinda não permite que se determine a data de sua ordenação sacerdotal. Deve ter sido, supomos, por volta de 1828. Com 25 anos de idade, em 1831, é coadjutor do padre Thomé Ferreira Soutto, de Sant’Ana da Barra do Espírito Santo (Santana de Patos). Naquele ano, os paranaibanos (patenses) vão buscá-lo, para dar-lhes assistência espiritual.

Espírito irrequieto, participante, José de Brito Freire aceita em 1832, o cargo de secretário da Sociedade Patriótica da Vila de São Domingos do Araxá, sem prejuízo de seu emprego no curato paranaibano. A situação belicosa então reinante obriga o Governo a transferir-se para São João Del-Rei, ali recebendo manifestações de apoio de toda a Província, muitas delas provindas de sociedades patrióticas.

Instalado o município de Araxá, em 1833, Santo Antônio do Paranaíba passa para seu Têrmo, desligando-se de Paracatu e conseguindo eleger suplente de vereador à Câmara Municipal o padre José de Brito. Em sessão ordinária do legislativo araxaense, de 19 de julho de 1833, já ocupando uma cadeira no mesmo, conforme livro de atas existente no arquivo da Prefeitura de Araxá, padre José é nomeado promotor público, com a seguinte observação: “… homem de alguns conhecimentos (das leis?) e apto para adquiri-los, de boa moral, muito amante das Novas Instituições”. Naquele tempo, cabe observar, o promotor público podia ser nomeado pelo Juiz Municipal.

Seu apego ao povo paranaibano acabaria motivando sua demissão. Tudo começou com a chamada à sua responsabilidade, para desempenho do cargo, do qual estava ausente, feita pela Câmara em maio de 1835. O promotor diz que achando-se “em comodo, assás interessante no Curato de Santo Antônio do Paranaíba”, só iria a Araxá por ocasião das sessões do Júri e da Junta de Paz. Indignados, os camaristas em sessão do legislativo, a 10 de junho de 1835, deliberaram remeter enérgica queixa ao governo, esclarecendo que o promotor se achava há mais de um ano da cabeça do termo, chegando o vereador Albino de Paiva a solicitar a demissão, pura e simples, do promotor. O governo entregou a queixa ao arbítrio do Juiz de Direito da Comarca de Paracatu. O padre Brito permaneceu irredutível. Não abandonaria o Curato paranaibano. Acabou sendo demitido. As autoridades araxaenses jamais o perdoariam. Por sua vez êle se mostrou um adversário à altura quando, no ano seguinte levantou o povo de Santo Antônio da Beira do Rio Paranaíba, exigindo a volta do distrito ao termo e município de Paracatu5. Em 1839 o padre José passa a responsabilidade do Curato a seu parente, padre Manoel de Brito Freire, ordenado por D. Francisco, Bispo de Goiás, a 25 de julho de 1838. Volta a residir em Paracatu, onde participa ativamente do partido liberal e dos movimentos revoltosos da época.

A última notícia que temos do padre José de Brito, vem de Araxá. Em 1851 ele ocupa o vicariato de Araxá, onde de novo se indispõe com as autoridades judiciárias e policiais, as quais acabam pedindo ao governo a sua demissão. A 21 de julho de 1851, o governo encarece a D. Francisco a necessidade da mudança do vigário. O prelado informa, a 11 de setembro do mesmo ano, ter posto novamente em concurso a Freguesia de São Domingos do Araxá, o que se verificaria a 18 de fevereiro de 1852 “recomendando muito, e muito, ao Revmo. Provisor e Vigário Geral, Hermogenes Cassimiro de Araújo Brons Wilke, a conduta do referido vigário, para ser ou não conservado, até que se verifique a colação de outro qualquer que seja do agrado de Sua Magestade Imperial”.

As provisões de vigários, invariavelmente, eram do livre arbítrio dos prelados. No caso do padre José de Brito sentimos que, além da animosidade local havia o desagrado do governo do Império. Possíveis resquícios de seu passado de homem contrário ao regime e um dos cabeças da sedição paracatuense.

* 1: O curador ou doutrinador. Padre que vivia às expensas dos aplicados, dando-lhes assistência espiritual em capela ou ermida.

* 2: Leia “Manoel de Brito Freire: O Segundo e Último Cura”.

* 3: Como a paróquia, também era um distrito eclesiástico, separado, independente da paróquia. Na verdade, o Cura tinha os mesmos poderes que os párocos. Com uma diferença: somente os párocos, provisionados, recebiam côngrua (quantia que eles recebiam anualmente) do Estado.

* 4: Dizia-se dos habitantes de uma aplicação, de uma acomodação de povos.

* 5: Leia “Rebelião Contra a Vila de Araxá na Década de 1930”.

* Fonte: Domínio de Pecuários e Enxadachins, de Geraldo Fonseca.

* Foto: Ocantinhodostesouros.blogspot.com.

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