DIFICULDADES DE RECRUTAMENTO NO FINAL DO SÉCULO XIX

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Até a regularização do serviço militar pelo sorteio, o recrutamento era o único meio que o Governo dispunha para levar a mocidade às armas.

Quando o comando da tropa recebia ordens para recrutar, a notícia corria, rápida, por toda a Província. Era o tipo de notícia que, de Ouro Preto, mais depressa ganhava todos os cantos de Minas. Raríssimos eram os que, em condições de seguir para a Capital, não se embrenhavam pelos matos, até passar o “perigo” do recrutamento.

O protecionismo campeava, de parte dos Juízes de Paz, aos quais competia apontar a rapaziada apta para integrar as milícias. No caso, os desafetos levavam a pior.

Uma carta do coronel Manoel da Silva Brandão, comandante do Quartel de Residência do Campo Grande da Nossa Senhora Sant’Ana do Bambuí, de 18 de novembro de 1808, dá conta ao governo da fuga de diversos recrutas que estavam sendo “amaciados” para o serviço de Sua Majestade.

Formado o regimento no largo fronteiro ao quartel, o comandante mandou que desse um passo à frente, “todo aquele que quisesse voluntariamente servir ao nosso adorável príncipe”. Ninguém se mexeu. Prossegue a autoridade: “Então me pus na urgente obrigação de nomear praças, que além de solteiros, se achavam em circunstâncias de marchar. No dia seguinte, para minha surpresa, a maioria tinha fugido para os sertões do Araxá”.

Nos tempos em que Patos era Santo Antônio dos Patos da Beira do Rio Paranaíba, o Juiz de Paz Antônio José dos Santos informava ao Governo, em 22 de setembro de 1837, que não fora possível “a prisão de um indivíduo deste distrito para a compleição do número de praças que coube a esta Província”.

De Araxá, da qual Santo Antônio dos Patos da Beira do Rio Paranaíba era distrito, João Carneiro de Mendonça dizia em 7 de janeiro de 1837: “Por mais diligência que tenho empregado, a fim de concluir o recrutamento, conforme me foi ordenado por V. Excia., não tem sido possível prender-se os recrutas, que faltam em número de nove, porque os Juízes de Paz negam-se ao cumprimento dos artigos 8.º e 20.º das instruções de 29 de novembro de 1835 e não cuidam de prenderem os desertores que me constam passearem de público em alguns distritos”.

“Os Juízes de Paz dizem que não os prendem, porque ninguém lhes assegura a vida de seus guardas nacionais, os quais, pelas mesmas razões, até se ocultam pelos matos”.

“Contudo continuo na diligência e pretendo sair a percorrer os distritos, e é certo que grande despesa fará a fazenda pública com os guardas nacionais e para despesas de recrutas é preciso algum dinheiro, e V. Excia. mandará o que for servido”.

Dois anos antes da Guerra do Paraguai, o delegado Pedro Alves Ferreira, de Patrocínio, oficiava ao governo, em 3 de janeiro de 1863, informando que nem ele, nem seus antecessores, tinham se esforçado para prender e remeter para a Capital os recrutas exigidos, por diversas razões. Uma delas, é que entre voluntários e designados, seguiram do Município de Patrocínio para Mato Grosso, 73 recrutas, e entre os mesmos só dois liberais “e isto mesmo, por intrigas”. Revoltado, finaliza observado que “foi uma descoberta que tiveram para perseguirem os seus contrários. Não respeitando pessoas casadas, algumas com três filhos, e outros que estavam
servindo de arrimo a seus pais. Motivo este de recrutar-se a lavoura, e muitas famílias ficarem ao desamparo”.

A Guerra do Paraguai, de 1865 a 1870, mudaria a composição do exército. A elite econômica do país, que formava a Guarda Nacional, legítima força militar brasileira, cedeu lugar a uma composição mais democrática do exército. Membros de todas as camadas sociais, e pretos alforriados, constituíam as tropas formadas contra o exército de Solano Lopez.

De Patos, muitos seguiram para os campos de batalha. Não ficamos sabendo os seus nomes. Em 17 de fevereiro de 1869, por determinação do Governo, o Coletor de Patrocínio pagava ao delegado de polícia do Termo de Santo Antônio dos Patos as despesas feitas com a captura de recrutas e designados para a Guerra do Paraguai.

Centenas de patenses ganharam os matos e cavernas, até a cessação do conflito. Temos notícia de um punhado deles, refugiados em cavernas situadas no vale do Rio São João, alimentando-se de caça e palmitos. As cascas de palmito eram aproveitadas por um mestre-escola integrante do bando, para o ensino das primeiras letras, utilizando espinhos em lugar de lápis.

Na Vila, era contado o verso:

No lardo da cadeia,
Formaram o Batalhão,
Prá pegar designado.
Solteiro e casado, não!

Maneira gaiata, muito do feitio da gente, de zombar das autoridades encarregadas do recrutamento naquela fase bélica.

* Fonte: Domínio de Pecuários e Enxadachins, de Geraldo Fonseca.

* Foto: Gestaodeempresas.net.

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