CAMELÔS X LOJISTAS EM 1994

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A Câmara Municipal de Patos de Minas foi palco recente de uma acirrada discussão entre Camelôs e Empresários do comércio da cidade. Em dias alternados, a Tribuna Livre da Casa foi ocupada pelo presidente do Sindicato do Comércio Varejista de Patos de Minas, Sebastião da Silva Andrade, o presidente do Clube dos Diretores Lojistas (CDL), Paulo Rodrigues Moreira e o camelô Armando Antônio da Cruz. No primeiro dia, os empresários reclamaram contra a existência do comércio clandestino na cidade se referindo às bancas de mercadorias instaladas na R. Padre Caldeira. Eles lembraram que o setor comercial é responsável por cerca de 60% da arrecadação tributária do município e lamentaram o fato dos lojistas serem prejudicados pelos camelôs. Os empresários acusaram os camelôs de venderem mercadoria contrabandeadas, na prática de uma atividade ilegal, sem que as autoridades tomem nenhuma providência no sentido de reprimir esta forma obscura de comércio. Antes, tanto os empresários quanto os camelôs, haviam mantido um encontro com o prefeito Jarbas Cambraia, na tentativa de se chegar a um acordo. Na ocasião, foram oferecidos empregos aos camelôs, que alegaram falta de colocação profissional no caso de abandonarem a profissão. Receosos, os camelôs ficaram arredios a esta proposta. “Eles podem nos mandar embora um mês depois e a gente ficar sem emprego”, descartaram.

As farpas dos empresários contra a atividade comercial clandestina na cidade não se restringiu apenas ao comércio dos camelôs. Eles denunciaram os inúmeros ônibus de turismo que partem constantemente de Patos de Minas para o Paraguai ou outros centros de compras, com o objetivo exclusivo de buscar mercadorias para serem comercializadas na clandestinidade. Para os empresários, este tipo de turismo maquiado é uma forma de incentivo à prática do comércio ilegal no município, e deve ser fiscalizado com maior rigorosidade. Os empresários acusaram as feiras artesanais promovidas em Patos de Minas. “Um produto só pode ser considerado artesanal, quando 80% dele for realmente manufaturado”, observou Sebastião Andrade, lembrando que muitos produtos industrializados são vendidos nas feiras artesanais. Foram feitas também acusações contra entidades que estão em débito com o SPC, o que de certa forma também significa que elas estão dando prejuízos aos lojistas. Novos critérios foram sugeridos pelos empresários para a liberação de recursos subvencionais às referidas entidades, com a exigência de certidão negativa de débito, inclusive, em relação aos próprios diretores das mesmas. Assim, uma entidade em débito na praça, só poderia receber recursos municipais se estivesse com a ficha limpa. Os empresários atacaram até o comércio varejista promovido anualmente no Parque de Exposições durante a Festa Nacional do Milho. Eles se sentem prejudicados pelas barracas que vendem mercadorias correlatas no período da festa, atraindo uma multidão de consumidores que poderiam recorrer às lojas da cidade. Este ano, por exemplo, os lojistas tentaram de todas as formas evitar tal prática, mas sentiram falta de apoio político para derrubar esta antiga tradição da Fenamilho. Eles quiseram, inclusive, arcar com o pagamento dos espaços dessas barracas, mas encontraram resistência por parte do secretário do Sindicato Rural, Pedro Maciel. Tiveram apenas a promessa de que, ao contrário dos anos anteriores os barraqueiros do setor varejista seriam retirados do parque na quarta-feira após a 36.ª Fenamilho. Nas outras festas, as barracas eram mantidas até por uma semana após o evento. “Pedro Maciel só pensa no dinheiro que entra para o Sindicato”, desabafou Sebastião Andrade, reforçando a tese de que as barracas prejudicam o comércio local.

BATALHA – A participação dos camelôs na Tribuna da Câmara Municipal revelou uma verdadeira batalha das muambas na briga pelos consumidores patenses. Ocupando o espaço na defesa de seus companheiros, o camelô Armando Antônio da Cruz, foi incisivo ao ser questionado pelos vereadores: “Muitas lojas também vendem mercadorias sem notas e contrabandeadas”, acusou ele, afirmando que 60% dos muambeiros de Patos de Minas que fazem compras no Paraguai são lojistas. Segundo os camelôs, os lojistas que estão contra suas barracas são justamente aqueles que utilizam a mesma prática de comércio ilegal em seus estabelecimentos. O camelô garantiu que tem até abaixo assinado de lojistas que não se incomodam com suas permanências na R. Padre Caldeira. “Nós também somos consumidores e compramos muitas coisas nas lojas da cidade”, observou. Armando Cruz considerou um exagero, a idéia de que oito camelôs prejudiquem um comércio estimado em mais de mil lojas e, neste aspecto, obteve concordância dos vereadores. Ele desmentiu ainda os comentários de que os camelôs sejam apenas testa-de-ferro de pessoas que sustentam suas atividades com o fornecimento de estoque de mercadorias. “Cada banca tem um proprietário”, assegurou, ao ser indagado se alguém teria o controle dos pontos.

Outro fator salientado por Armando Cruz é a espécie de direito que os camelôs adquiriram no decorrer dos anos com suas bancas na R. Padre Caldeira. Ele próprio instalou-se naquele local nos meados da década de 1970, durante a administração do ex-prefeito Waldemar da Rocha Filho. “Sempre procurei regularizar minha situação, mas nunca consegui”, lamentou. Os camelôs querem ser legalizados junto à Prefeitura, a exemplo do já ocorre em outras cidades. “Em Três Marias, cidade menor que Patos de minas, existem doze camelôs regularizados. Por que em Patos de Minas isto não pode ser feito?”, questionou Armando Cruz. Ele rebateu a idéia de que a regularização poderia incentivar a proliferação da atividade, observando que os próprios camelôs são fiscais da praça, já que impedem a entrada de novos elementos no ramo.

REFLEXOS – Os reflexos das discussões entre os camelôs e os lojistas atingiram em cheio os vereadores patenses. No final do debate, o resultado apontou uma quase unanimidade a favor da manutenção desta atividade. Os vereadores resguardaram apenas alguns pontos necessários para que isto aconteça, principalmente, no que se refere à condição extrema de se manter apenas as bancas existentes. “Acho que a Prefeitura poderia conceder alvarás somente para os oito camelôs da R. Padre Caldeira”, concluiu o vereador Silvio Gomes de Deus (PMDB), após o embate. Ele entendeu que este número de camelôs não é suficiente para prejudicar os lojistas. Para o vereador, o difícil é controlar os cerca de 5.000 vendedores ambulantes que fazem um comércio de porta em porta na cidade, incluindo neste número até os leiteiros clandestinos. “Tem gente vendendo de tudo e não há como fazer uma fiscalização deste comércio informal”, alertou o vereador.

Após a discussão o presidente da Câmara Municipal vereador José Osmar de Castro, determinou a formação de uma comissão especial para tratar do assunto junto ao prefeito Jarbas Cambraia. Posteriormente, a comissão foi formada com os vereadores Dercílio Amorim (PFL), Adalto Gonçalves (PL), Edimê Avelar (PDT) e Silvio Gomes de Deus (PMDB). A comissão discutiu informalmente a questão com o prefeito Jarbas Cambraia, que convenceu os vereadores de que a solução do problema é restrita ao Executivo Municipal. Com esta medida, ficou a cargo do próprio prefeito decidir a questão, e tudo indica, que ele não está disposta a acatar a proposta de manter as bancas em atividade. Conforme informações do secretário municipal de obras, Arnaldo Queiroz, as obras de restruturação da R. Padre Caldeira deverão ser iniciadas ainda no mês de julho. Desta forma, os camelôs deverão ser retirados daquele local sem direito a usarem outras áreas para a manutenção de seus comércios.

* Fonte: Texto publicado com o título “A Batalha das Muambas” e subtítulo “Lojistas e Camelôs Trocam Acusações na Câmara Municipal” na edição n.º 1 de 10 de julho de 1994 da revista Diga, do arquivo de Luis Carlos Cardoso.

* Foto: Montagem de Eitel Teixeira Dannemann sob Usp.br (1) e Negocio-proprio.info (2), meramente ilustrativas.

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