NOSSO INÚTIL CÓDIGO DE POSTURAS – PASSEIOS

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TEXTO: EITEL TEIXEIRA DANNEMANN (2017)

Quando em 1868 a então Vila de Santo Antônio dos Patos se emancipou, o cidadão Jerônimo Dias Maciel foi empossado como Chefe do Executivo, o nosso 1.º Prefeito. De visão progressista, tanto que em seu discurso de posse vislumbrou explorar a navegação no Rio Paranaíba, tratou logo de confeccionar um Código de Posturas. Nos neurônios privilegiados de Jerônimo, as sinapses sabiam que nenhuma comunidade vive em paz sem um Código de Posturas, uma coleção de Leis que estabelece normas de polícia administrativa e comina penas aos infratores, que, por ação ou omissão, infringem a legislação e os regulamentos do Município. Parece simples, e realmente é muito simples, desde que as autoridades competentes o levem a sério.

Se nos tempos de Jerônimo Dias Maciel o Código de Posturas era um documento respeitado, não se sabe. Mas, de lá para cá, com as inúmeras mazelas que foram se aglomerando na cidade, é fácil perceber que, ano após ano, o Código de Posturas foi negligenciado. Os exemplos são muitos, tetricamente muitos. A constatação é que nos dias de hoje o nosso Código de Posturas, atualizado pela última vez através da Lei Complementar n.º 379 de 24 de janeiro de 2012, é um aglomerado de leis totalmente inútil.

Está determinado no Artigo 2.º: Este Código contém as posturas destinadas a promover o bem estar e a qualidade de vida no ambiente municipal, por meio do ordenamento dos comportamentos, das condutas e dos procedimentos dos cidadãos do Município de Patos de Minas, devendo o Executivo EXERCER o seu poder de polícia para garantir a aplicabilidade desta Lei Complementar. Aqui começa a bandalheira, pois aquele que em primeiro lugar deveria dar o exemplo, que é fiscalizar e punir os infratores, não o faz. A bandalheira se propaga no poder legislativo, que, assim se exige dele, deveria fiscalizar e cobrar do poder executivo o respeito à Lei. Mas também o poder legislativo, apegado ao descalabro de se reunir quatro horas por semana, não o faz. E a bandalheira se completa com o ministério público, que voa no tempo vendo o bonde passar, e nada faz para obrigar os responsáveis a cumprir a Lei.

Assim, com a Lei sendo mais vilipendiada que a Cruz de Cristo no inferno, o nosso Código de Posturas se transformou num manual de inutilidades. Alguns exemplos sobre os passeios ou calçadas desnudam a realidade:

ARTIGO 18: Cabe ao proprietário de imóvel lindeiro a logradouro público a construção do passeio em frente à testada respectiva, a sua manutenção e a sua conservação em perfeito estado.
§ 3º: No caso de não cumprimento do disposto no caput deste artigo, poderá o Executivo realizar a obra, cujo custo será ressarcido pelo proprietário, acrescido da taxa de administração, sem prejuízo das sanções cabíveis.

ARTIGO 20: O revestimento do passeio deverá ser de material antiderrapante, resistente e capaz de garantir a formação de uma superfície contínua, sem ressalto ou depressão.

ARTIGO 24: Nenhum projeto arquitetônico ou urbanístico será aprovado ou licenciado e nenhuma obra ou serviço receberá certificado de conclusão, bem como não será emitida certidão de Habite-se e nem termo de recebimento de obra de infraestrutura, sem que o Poder Executivo ateste o atendimento às regras de acessibilidade previstas nas normas técnicas brasileiras de acessibilidade, na legislação específica e demais regramentos previstos neste Código.

ARTIGO 31: O passeio não poderá ser usado como espaço de manobra, estacionamento ou parada de veículo, admitindo-se somente como acesso a imóvel. Parágrafo único: É proibida a colocação de cunha de terra, concreto, madeira ou de qualquer outro objeto na via pública para facilitar o acesso referido no 9 caput deste artigo, que terá de ser feito apenas pelo rebaixamento do meio-fio e pelo rampamento do passeio respectivo.

ARTIGO 32: As águas pluviais serão canalizadas por baixo do passeio até a sarjeta lindeira à testada do imóvel respectivo, sendo proibido seu lançamento sobre o passeio.

ARTIGO 33. É proibida a instalação precária ou permanente de obstáculo físico ou de equipamento de qualquer natureza no passeio ou projetado sobre ele, salvo no caso de mobiliário urbano.

Não é preciso ser entendido no assunto para perceber que quase todos os nossos passeios são totalmente contrários à Lei. E se são totalmente contrários à Lei é porque o poder público assim o permitiu. E se o poder público permitiu e continua permitindo, é porque ele próprio reconhece que o nosso Código de Posturas não tem valor algum. O exemplo mais apavorante da falta de respeito e do descaso do poder público para com o nosso Código de Posturas relacionado a passeios ou calçadas está registrado na foto¹, um verdadeiro convite ao pedestre a um acidente fatal. A autoridade que permitiu essa aberração, num país sério, já teria respondido judicialmente pela irresponsabilidade.

* Foto: Eitel Teixeira Dannemann, publicada em 24/12/2016 com o título “Vilipêndio ao Pedestre”.

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