GAGUINHO X GAGUINHO

Postado por e arquivado em CANTINHO LITERÁRIO DO EITEL.

Um boteco que fica ao lado do Mercado Municipal já esteve em melhores condições que atualmente. Eu e uma simpática turma já tomamos algumas geladinhas lá nos bons tempos. O antigo proprietário era gente boa, chegado, e fazia um churrasquinho de gato que era uma delícia. Um dia a turma tradicional resolveu pregar uma peça no amigo Gaguinho. Acontece que a vida não é uma ciência exata, por isso quando a gente imagina que ela segue pra direita na realidade está seguindo pra esquerda depois de já ter passado pelo centro.

Lá no Mercado Municipal tinha um açougueiro que era gago também, e a coisa que ele mais detestava era alguém imitá-lo, o que não ocorria tanto assim com nosso amigo. Quando isso acontecia o cara do açougue partia pra briga mesmo. Todo mundo sabia disso, menos o nosso amigo. Tudo combinado, o botequeiro pediu ao Gaguinho que fosse ao açougue pegar uns quilos de picanha. Ele foi, chegou lá e pediu a carne. Quando o açougueiro ouviu logo pensou que era zoeira do amigo e já ficou nervoso:

– O queee é quee fooi quee voocê diiiiiisse?

Quando o nosso amigo ouviu o outro gaguejando, foi a vez dele imaginar que o cara estava lhe zoando.

– Eeeu diiiisse o queee diiiise e proonto.

Na oportunidade, ficamos sabendo depois, o movimento era grande no mercado. No princípio a turma presente imaginou que era brincadeira. Isso até que o açougueiro se armou de uma enorme peixeira e exigiu:

– Reeepeeete seeee foooor hooooomem.

Quando o Gaguinho, o nosso amigo, viu o cara com a peixeira na mão, ameaçou um confronto dizendo:

– E eeeu sooeu meeesssmo hooemeeem praaa…

Mas não conseguiu terminar a frase, pois o açougueiro deu um grito fenomenal e partiu pra cima. O nosso amigo, que não levava desaforo pra casa, numa reação rápida começou a pegar pacotes de carne seca embalada que estavam no balcão e fez deles poderosos tiros de bazuca. O primeiro pegou no facão e este foi ao solo. Outros vieram com tanta força que o açougueiro arriou. Quando o próximo tiro de carne seca estava armado, do chão o açougueiro gritou:

– Paaara cooom iiiisso, paaara cooom iiiisso…

Foi o bastante para o amigo encerrar a artilharia. Olhou para o inimigo e perguntou:

– Peeeraí, vooocê taaambém é gaaaago?

O comerciante, já se levantando, respondeu:

– Sooou!

O que aconteceu depois foi notório para nós que arquitetamos a pegadinha. Como eu disse, a vida não é uma ciência exata. Os dois gagos, gaguejando entre si, se entenderam e, pior, perceberam que armaram pra cima deles. Estávamos nós esperando o açougueiro surgir em correria atrás do nosso amigo Gaguinho quando, de repente, vislumbramos os dois aparecerem no boteco a fim de nos transformar em espetinho de gato. Não precisa nem dizer que saímos em carreira desembestada. Ainda bem que tudo se resolveu, continuamos amigos e o fato se fez parte eterna de nossas reminiscências.

* Texto: Eitel Teixeira Dannemann.

* Foto: Montagem de Eitel Teixeira Dannemann sobre foto publicada em 10/04/2017 com o título “Jardineira de Pedro Gomes Carneiro”.

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