DEIXAREI SAUDADE – 34

Postado por e arquivado em 2017, DÉCADA DE 2010, FOTOS.

Já ouvi muitos desaforos. Já presenciei muita gente me olhando com cara de quem não gostou do meu estilo. E pior, achando-me desengonçada com esta escadinha e com a porta e as janelas como que querendo invadir o passeio. Até já se perguntaram quem foi o gênio que arquitetou este caixote. Ligo não, não tenho mágoa de ninguém. Nunca vou dar importância a quem me desvaloriza, a quem me despreza. Não retruco nenhuma mágoa ou ofensa. Fico caladinha aqui no meu canto, nesta rua que já foi barro e mato para todo lado, e que hoje se chama Anicésio Vieira. O que verdadeiramente sinto é pena daquele que me humilha. Conforta-me a felicidade das almas que me habitam. São pessoas simples e humildes como eu. Sempre senti a presença deles me injetando vida, fazendo-me acreditar que serei eterna. Nunca fui vítima de sonhos sem sentido, de esperanças perdidas. Não desisto da vida, mas igualmente, como as almas que me habitam um dia morrerão, também chegará o dia em que deixarei de existir.

Este pessoal que acha estranho minha cara no passeio é gente jovem, da era da tecnologia, que não viveu o tempo em que nasci praticamente à beira do espelho d’água que hoje eles chamam de Lagoinha. Isso aqui era uma beleza, lugar calmo, com poucas casas, tudo gente simples e sofrida, tinha a olaria do João Luiz Redondo, que hoje dá nome à lagoa, e ninguém se preocupava em invadir a casa dos outros como atualmente. Acompanhei atentamente a mudança ambiental de tudo por aqui. Presenciei sem me desesperar o desaparecimento de inúmeras irmãs e o surgimento de prédios no lugar delas. É o destino, afinal, nada acontece por acaso. Para os humanos, pensamentos podem se transformar em ações. Para eu e minha espécie, nunca, pois não temos poder de decisão. Eu não posso decidir o meu destino. São os humanos que decidem o meu destino. Não penso mais no amanhã, nem no hoje e nem no ontem. Apenas espero a decretação do meu fim. E quando acontecer, ninguém poderá contestar que, desde o primeiro tijolo assentado, passei a pertencer à História de Patos de Minas. E deixarei saudade!

* Texto e foto (06/09/2017): Eitel Teixeira Dannemann.

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