AMORIM X MACIEL: DESAVENÇA EM 1925

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Para que a população desta Cidade não faça commentarios em torno de meu nome, desfavoraveis á reputação de que felizmente gozo, julguei de meu dever de cidadão livre e que tenho a comprehensão exacta da minha liberdade e dos meus direitos, trazer para as columnas do nosso jornal, a narração do incidente havido entre mim, de um lado e os Srs. Antonio Maciel e Genaro Maciel de outro lado.

Foi isto simplesmente:

Descia a rua Olegario Maciel, Domingo passado, em companhia de minha esposa, com destino á Egreja Matriz, onde ia cumprir com meu dever de catholico – á missa.

Ao virar a esquina da referida rua com o Largo da Matriz, encontro pela frente o Dr. Antonio Maciel que sem mais aquella, esquecido dos mais comesinhos principios de educação, vae dizendo: “Isto não póde continuar, vamos acabar com isto, já foi atè ao ponto onde podia chegar”. E o outro, o sr. Genaro Maciel, de uma das janelas da “Barbearia Central”, completando o que queria dizer o primeiro, accrescenta: “Vamos queimar esse jornaleco”… E, pasmo, ainda ouvi o Dr. Antonio Maciel continuar: “Só lá em casa tem seis cangussùs¹ criados para isso”… (!!!)…

Credo, Deus me livre e guarde.

Dei-lhes a resposta que julguei do meu brio dar, como cidadão que sabe onde termina os seus deveres para começar os seus direitos. Disse-lhes que eles estavam enganados com a situação actual. Que já se foi o tempo em que elles pisavam o povo e exigiam que se abaixasse a cabeça para pisarem mais; e quanto ao “Jornal de Patos”, si fossem capazes de queimal-o, que podiamos ir juntos, naquelle momento mesmo e… dei-lhes as costas.

Só mais tarde vim a saber que o incidente não havia ficado nisso. Minha Esposa, um tanto assustada com a provocação grosseira, afasta-se, e quando virei as costas para acompanhal-a , notou ella ainda que o Dr. Antonio Maciel, num gesto de desmedido orgulho, batendo no peito retrucou: “pisamos e havemos de pisar”

Como se o povo do Municipio de Patos fosse já um cadaver social.

Eis o facto tal como se deu e para o qual eu chamo a attenção das auctoridades competentes.

Approveitando esta opportunidade, eu lhes devo dizer ainda que o “Jornal de Patos” foi fundado, não para combater pessôas, mas sim os erros e desmandos daquelles a quem estão confiados os interesses do povo e a guarda da justiça no Municipio.

Si julgarem que está exagerado, que está mentindo ou calumniando, processem os seus responsaveis, venham pelos meios legaes, ha uma lei de imprensa, draconiana sim, mas é lei. Esses processos truculentos e espectaculosos para armar effeito ao populacho na praça publica, não é de gente que se prese e muito nos faz descer no conceito de que já gozamos de povo civilisado.

Contestem pela imprensa, o que o “Jornal de Patos” tem expendido, pois ha tantos jornais em nosso glorioso Estado. E se não o querem por esse meio que lhes aconselho e acho mais bonito, tambem pelo outro nós, eu e meus companheiros, não queremos , por se não coadunar com os principios de educação que recebemos de nossos paes.

Entretanto, fiquem bem avisados de que, em qualquer terreno, estaremos sempre em posição de guarda, na defensiva.

José Gonçalves de Amorim.

* 1: Hoje grafado como canguçu, substantivo masculino do tupi-guarani acanga + uçu. Acanga exprime a ideia de cabeça, chefe, começo, origem. Canguçu pode se referir a: 1) onça de grandes malhas e maior que a comum, também chamada acanguçu; 2) caipira, tabaréu; 3) alguns tipos de arbustos. O problema é saber o que o Dr. Antônio Dias Maciel quis dizer com cangussú!

* Fonte: Texto publicado com o título “Na Defensiva” na edição de 08 de março de 1925 do Jornal de Patos, do arquivo do Laboratório de Ensino, Pesquisa e Extensão de História (LEPEH) do Unipam.

* Foto: Vidracaria.psdovidro.com.br.

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