LEÔNCIO E AS DUAS PREVISÕES DO FREI

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Conhecido carroceiro, Zé Tonhão fazia ponto na Avenida Brasil perto da saudosa Casa Saraiva. Dignamente criou seus oito filhos com o rendimento dos fretes executados em seu veículo puxado pela égua Manhosa, que ostentava um enorme escudo da URT na testa. Apaixonado pelo time da Velha Mangueira, era fã incondicional do quarto-zagueiro Fernando Dannemann, para ele o melhor beque do mundo. Certo dia, uma de suas crias, o moço e simplório Leôncio, estava podando uma árvore no quintal de uma casa em frente à Igreja dos Capuchinhos. Desajeitado na função, apoiava-se num galho meio suspeito quando um frei conhecido da família, presenciando a peripécia, o advertiu:

– Rapaz, tome cuidado que esse galho não vai aguentar o seu peso e você vai se esborrachar no chão podendo se machucar muito.

E o Leôncio nem aí, continuou lá. Mas por pouquíssimo tempo. De repente, galho partido e o jovem foi ao chão remoendo as dores. Assombrado com a antevisão do frei, Leôncio lhe inquiriu:

– O senhor disse que eu ia cair da árvore e cai mesmo. Será que seria possível o senhor saber do dia da minha morte?

Rindo por dentro da ingenuidade do rapaz, o frei respondeu:

– Está escrito há muito tempo. Quando acontecer da Manhosa relinchar cinco vezes seguidas para você, esse será o dia da sua morte.

Impressionado, a partir daquele momento, toda vez que ele chegava perto da égua, suava na sofrida expectativa do animal relinchar cinco vezes. O tempo passou, uns dois anos depois, Leôncio, montado na Manhosa, foi até uma fazenda muito depois da antiga ponte do Rio Paranaíba visitar um parente. No caminho de volta, a égua, só ela percebendo uma cobra ao lado da trilha na posição de bote, estacou e começou a relinchar: um, dois, três, quatro e… cinco. Imediatamente, disparou num galope alucinante. Com muita dificuldade, o cavaleiro a conteve o suficiente para se desvencilhar da sela. E a Manhosa sumiu no mundo. Foi então que bateu um desespero tremendo no Leôncio ao lembrar a previsão do frei. Abaixou a cabeça, começou a chorar e com muita emoção gritou:

– Morri!

Com a certeza de que estava realmente morto, deitou-se ao chão e por lá ficou, totalmente imóvel. Pouco depois passaram pelo local dois empregados da fazenda e viram o corpo inerte. Crendo na morte do rapaz, um foi até sua casa e voltou com uma rede. Ajeitaram o “morto” e foram conduzi-lo aonde morava, uns duzentos metros depois do rio. Muito antes da ponte, os dois se depararam com uma encruzilhada com dois caminhos e ficaram indecisos sobre qual deles seria o mais curto. Aí deu-se início a uma discussão, cada um dos homens optando por uma direção. Depois de pelo menos uns dez minutos, com a rede já pesando nos ombros dos homens, o Leôncio não aguentou mais, e levantando a cabeça disse:

– Ôceis dois aí, peguem o caminho da direita porque passei por ele várias vezes quando eu era vivo.

Terrivelmente assustados, os dois homens soltaram de uma vez a rede e fugiram num galope maior que o da Manhosa. Infelizmente, o Leôncio era um tremendo azarado. Na brusca queda, o pobre rapaz bateu com a cabeça numa enorme pedra pontiaguda e morreu de fato. Se foi coincidência ou não, se foi coisa divina ou não, se foi clarividência ou não, a verdade é que as duas previsões do frei se concretizaram!

* Texto: Eitel Teixeira Dannemann.

* Foto: Montagem de Eitel Teixeira Dannemann sobre foto publicada em 28/02/2013 com o título “Prefeitura em 1916”.

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