EFEITOS POÉTICOS DA CHEGADA DA LUZ ELÉTRICA

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TEXTO: MARCOLINO FERREIRA DE BARROS (1915)

Depois da instalação da luz elétrica¹, a cidade parece que mudou; os seus habitantes estão mais folgazões e mais risonhos; à noitinha, vêem-se passeando de braço dado, as formosíssimas filhas de Patos, cujos olhos brilham com fulgor, velados por larguíssimas pestanas; os toques maravilhosos de alva luz, sobre os edifícios de arquitetura moderna, incidem sobre estes espelhos de pedra branca, dando-lhes uma beleza inimitável; o viajante ao pisar esta boa terra, parece visitar aqueles lugares, cheios da figura de Homero; parece ouvir-se nos seus córregos, o murmúrio do arroio a cujas margens ele nascera à sombra de frondosas árvores, embalado pelas endeixas de um coro de rouxinóis.

As crianças, como pequeninas mariposas, juntam-se em derredor da luz e nos inocentes folguedos da infância, brincam descuidosas.

Observador profundo, que contemplar esta cidade à noite, parecerá ouvir uma harmonia inextinguível nos ares, e ver uma corda sonora de inspiração artística nos corações. Como tudo se aformoseia! Como tudo canta!

Ao vermos as crianças trepadas nos ramos das árvores a procura de um ninho, lembra-nos daquele passarinheiro cantado por Bion e Mosco, o qual untou de pez, os ramos das árvores, para caçar o amor e um velho lhe disse: “Pequeno, não procures na tua idade esse bichinho; quando fores maior, verás que ele vem por si mesmo, pousar por longo tempo sobre o teu atormentado coração”.

Tanta poesia não tem nem uma sombra e nem uma mancha. Que foram feito dos bêbados e dos malfeitores, que faziam as esposas tremerem de susto, pela sorte de seus esposos, quando precisavam sair nas horas caladas da noite? Fugiram para as trevas, para os lugares escusos; como os guarás ou lobos vermelhos, eles não enxergam com a claridade; a claridade, a luz se fez para aqueles que têm pensamentos bons e os sentimentos santos.

A eletricidade vai invadindo tudo com a sua luz, com a sua vida; com razão chamaram o século XX o século da eletricidade, em contraposição do século XIX, que foi o das luzes.

É imprescindível e urgente mesmo que cada pai de família procure fazer a sua instalaçãozinha em seu lar; bem sabemos que não se consegue nenhum melhoramento novo, sem grandes esforços, sem imensos sacrifícios; um povo que se acha habituado à lamparina, à candeia e à banha de porco, dificilmente compreenderá a vantagem da luz elétrica; compreende, porém, logo os resultados práticos que dela dimanam.

Diminuirão os acidentes, as crianças não mais serão queimadas, como se tem ultimamente dado nesta cidade.

Devido à força, as indústrias tomarão grande impulso, uma nova época vai surgir para elas; soou a hora apocalíptica da antiga Patos. Não tardará que passe à história e a tradição com que as vovós fazem dormir seus netinhos; “a clássica bacia de cobre para lavar os pés à noite, a candeia de azeite com o indispensável mancebo, o barulhento colchão de palha de milho, o lençol de babado de renda, a casa de pau à pique, o dormir às 7 horas da noite e levantar às 6 da manhã, enfim tudo quanto é caduco tudo quanto é bolorento”. O capital doravante, não será amarrado em um lenço de quadrados a espera que seja chamado a recolhimento; o dinheiro girará, o empréstimo não há de ser um favor, que um indivíduo fica devendo a outro; fará parte das operações de crédito. Não há nada tão belo quando contemplarmos numa justa visão das coisas a direção que tomam as correntes humanas, trazidas por uma vitalidade intrínseca, que, como disse o notável escritor ou se chame Providencia ou se chame Evolução, é um fato irrecusável e claro como a matéria que se palpa, como a luz que se vê.

Nós vemos nas brumas surgirem, as indústrias, não aquelas indústrias antigas, que precisavam de milhões de braços, voltados à contínuas labutações, mas sim às indústrias modernas movidas pela eletricidade. Queremos indústria porque ela é a base da política, é o alimento social. Queremos a indústria porque ela é a força mantenedora das energias que constituem a razão e o sentimento humano. Uma cidade sem indústria, não é uma cidade; existe nela a estagnação mórbida do Asphaltita; queremos as agitações vitais e febris dos grandes centros industriais. Concluímos este nosso mal elaborado artigo, conjurando aqueles que possuem capitais, a ajudar com o seu contingente a grande obra de Amadeu Maciel, que não muito longe, terão feito desta terra um lugar de delícias.

* 1: A luz elétrica chegou em 15 de agosto de 1915. Leia “Eletricidade: da Lamparina à CEMIG – Histórico da Força e Luz”.

* Fonte: Texto publicado na edição de 05 de setembro de 1915 do jornal Cidade de Patos, do arquivo do Laboratório de Ensino, Pesquisa e Extensão de História (LEPEH) do Unipam.

* Foto: Bbc.com.

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