DEIXAREI SAUDADE − 78

Postado por e arquivado em 2019, DÉCADA DE 2010, FOTOS.

Não me lembro se foi em 1969 ou no início de 1970. Não importa, o que eu tenho gravado em minhas paredes é a cara de felicidade das primeiras almas que me habitaram quando tomaram posse de mim. Ouvi inúmeros comentários sobre a enorme quantidade de casas simples e humildes como eu que foram construídas nesse pedaço de Cerrado¹. O entusiasmo delas ao acomodarem em seus devidos lugares os rústicos móveis e eletrodomésticos me contagiou. Afinal, era a primeira moradia própria daquele pessoal. Assim, foi muita felicidade no início. Com o tempo e com o crescimento da Cidade, e principalmente com a chegada da Faculdade de Filosofia logo ali embaixo, as transformações começaram a acontecer. Muitas de nós foram melhoradas e outras tantas sofreram verdadeiras cirurgias plásticas, mudando totalmente seu visual. Eu não tive a mesma sorte que essas últimas, pois nasci simplória e quase 50 anos depois continuo simplória, com pouquíssimas melhoras, amargando no âmago a mudança do visual no meu entorno.

Esse meu amargor tem tudo a ver com esse edifício aí atrás de mim e com a visita de uns sujeitos que me expiaram de tudo quanto foi jeito. Pois foi exatamente assim que brotou esse tal edifício. Lá estiveram uns tais sujeitos e expiaram a casa semelhante a mim. Pouco tempo depois, demoliram-na. Passados alguns meses, começaram a construir o desgramado do edifício. E aí, o que pensar? Em todas as almas que me habitaram? Em todas as minhas semelhantes que se transformaram em entulhos? Quando analiso tudo o que está acontecendo na Cidade, o que se forma em volta de mim é uma nuvem negra, não de chuva, mas de realidades cruéis. E estas realidades me dizem sem um pingo de sensibilidade que a minha vez está chegando, que não adianta, que todas nós já tivemos o nosso tempo e que vamos ceder lugar aos edifícios. Quando chegar esse meu dia, vou com dignidade, pois sei que faço parte da História de Patos de Minas e, acima de tudo, deixarei saudade!

* 1: Leia “Anunciada a Construção das Casas Populares”. Não se sabe ao certo quando a região das Casas Populares foi considerada bairro com o nome de Abner Afonso. Oficialmente, foram definidos pela primeira vez seu perímetro e seus logradouros em 14 de maio de 1997 através da Lei n.º 4.387 (Leia “Abner Afonso” na Categoria “Bairros: Perímetros e Logradouros”). O imóvel está localizado à Rua P1B, esquina com sua colega José Augusto de Queiroz.

* Texto e foto (21/03/2019): Eitel Teixeira Dannemann.

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