VISÃO URBANÍSTICA DE ZAMA MACIEL EM 1937 – I

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TEXTO: ZAMA MACIEL (1937)

Muito se tem falado em construções, quer de edifícios de moradia, quer de casas comerciais. É a prosa de toda roda, e o anseio de todo o patense. A cidade quer crescer, ampliar-se, tornar-se bonita, acompanhando a marcha ascensional de nossa produção agrícola.

Cada qual quer dar a sua opinião, e estas surgem e quase sempre morrem ao dissolver da roda. Contudo, algumas vão sendo repetidas, e criam adeptos. Idéias que a maioria das vezes contrariam ao bom senso, tomam corpo pela força da repetição.

É pois necessário a quem se tomou ao trabalho de observar as condições atuais da cidade, e medir as suas necessidades futuras, recordar aos entusiastas do progresso, certas regras (se assim se pode exprimir) que orientam a formação da cidade moderna, e de cujos destinos muito se espera. Assim.

A Prefeitura, por determinação do atual Prefeito, mandou organizar a planta da cidade, e traçar-lhe as ruas futuras, no objetivo de impedir o crescimento desordenado da parte habitada, maior dia a dia. Neste trabalho, foram observadas, tanto quanto possível, as normas seguidas na América do Norte, onde geralmente, as cidades são traçadas em xadrez, cortando-se as ruas em ângulo reto.

No papel, ficaram riscadas largas avenidas, cortadas por ruas retilíneas, logradouros públicos, lagos, parques, campo de aviação, estação ferroviária, etc.

As avenidas tais e tais são destinadas a isto e aquilo. E assim a Avenida Municipal¹ com o seu atual quilômetro de extensão foi destinada à habitação particular, devida a sua exagerada largura e à perspectiva que podem oferecer casas pequenas e de bom gosto, fronteando os seus passeios gramados e jardins floridos que a pequenada destrói.

Nela prédios de dois, três andares tornam-se ridículos porque não têm magnitude para se imporem à largura (repisamos) exagerada com que os antigos irrefletidamentes a construíram.

Somente edifícios semelhante à igreja matriz, em construção, com suas torres de cinqüenta metros, podem nela sobreviverem. Pequenos prédios, vivendas graciosas, de cujas janelas caiam trepadeiras, no conjunto dos jardins, e na imensa claridade de nossas tardes, farão dela recanto cobiçado à moradia.

Enfeia-la com prédios comerciais de pequeno porte, e com casas de diversões barulhentas será obra de mau gosto, que se torna necessário evitar.

As ruas comerciais estão determinadas no referido plano, e dentre as atuais destacam-se: Desembargador Frederico² e General Osório. A primeira presta-se admiravelmente pela sua largura e situação à localização do comércio.

Ela deverá atravessar a cidade de norte a sul e morrerá na futura praça da estação ferroviária³, onde atualmente se ergue o barracão da Companhia do Trigo. Será futuramente a mais central da cidade.

É de uma boa norma localizar-se o comércio em determinadas zonas (zoneamento, chamam a isto os urbanistas), bem como as fábricas, os edifícios públicos, as escolas (não as primárias que devem ser espalhadas nos bairros residenciais) devem também ter as suas zonas separadas.

Não será, pois, estranho que se diga: é necessário a localização do comércio patense em determinado ponto da cidade, aquele mais conveniente. Dentre estes, atualmente, nenhum como a rua Desembargador Frederico, onde, instintivamente, se vão agrupando os negociantes inteligentes.

Nesta rua não devem ser construídas residências, pois que, além de mau gosto, dificultará à Prefeitura no fornecimento de água, luz, etc., o que não pode ser igual para uma casa comercial e para uma de morada.

As ruas comerciais são barulhentas e quem nelas mora não pode ter o sossego, tão necessário ao trabalhador. As casas bancárias devem se localizar perto das ruas comerciais, mas nunca na própria rua, para conforto do bancário condenado a contar o dia todo.

O público tem necessidade de que o comércio se localize em determinado ponto, o que traz grande vantagem para todos. Excetua-se, no caso, o comércio de gênero à retalho, que se deve, como a escola primária, espalhar-se pelas ruas de residência, no intuito de facilitar a aquisição diária dos gêneros alimentícios. É necessário uma lei que localize o comércio em determinada zona, e impeça a construção de casas residenciais neste mesmo bairro.

A urgência desta lei, ressalta patente a quem percorrer a cidade. Casinhas, estilo qualquer coisa, a que certos desenhistas da terra chamam bungalow4, estão sendo construídas sem nenhuma orientação, desfigurando a fisionomia da rua Des. Frederico, onde deveria ser exigida a altura mínima de seis metros para todo o edifício.

Fala-se, atualmente, na construção de um prédio para sede de uma agência bancária. A Prefeitura deve tomar posição no sentido de localizá-lo em lugar conveniente, de acordo com as exigências do comércio e do público.

A mesma orientação é mister se tome em relação ao falado cinema, cujo edifício, projeta-se, de apreciável preço.

Em torno do Hospital Regional devem ser construídos prédios destinados a consultórios, farmácias, etc. Outra zona deve ser destinada à instalação de fábricas, oficinas, serrarias, etc., e pegado a este bairro o destinado à habitação do proletariado.

Aqueles que desejam construir devem ter em mente estas pequenas coisas e não o interesse pessoal momentâneo. Todos devem contribuir com um pouco de boa vontade para o progresso da cidade.

Alguns deixam grandes extensões de muros caídos e sem trato, na espera de alguém que compre a posse por preço de torná-los ricos. Erro e estupidez.  Ninguém construirá uma boa casa em rua que tenha aspecto de tapera, onde os muros caídos e as mangueiras seculares recordam os bons ou maus tempos de antanho. Limpem os muros, e ajudem os poderes públicos na conserva das ruas e verão as suas propriedades valorizadas e, assim cobiçadas. É necessário uma providência neste sentido.

Com alguma boa vontade obter-se-á bastante.

* 1: Atual Avenida Getúlio Vargas.

* 2: Depois teve o nome alterado para Benedito Valadares e hoje é a atual Rua Major Gote.

* 3: A linha férrea estava programada a vir para Patos de Minas, mas não veio. Leia “Dr. Euphrásio Escreve Sobre a Estrada de Ferro e a Violência”, “Carta do Dr. Euphrásio José Rodrigues Para Olegário Dias Maciel Sobre a Estrada de Ferro”, “A Questão da Estrada de Ferro”, “Moinhos Minas Gerais S/A e o Trigo de Patos”.

* 4: Bangalô, é um tipo de casa de um só andar, muito popular na América do Norte. A palavra deriva do guzerate banglo, que por sua vez vem do hindi banglã. Ela significa “bengali”, no sentido de “casa no estilo de Bengala”. Essas casas eram tradicionalmente pequenas, de um só andar e tinham uma varanda. Os bangalôs modernos são um tipo de casa normalmente de um andar ou um andar e meio, e podem ser muito grandes. Na Índia, o termo Bangalô refere-se a qualquer residência pertencente a uma só família (i.e., uma casa), em oposição ao edifício de apartamentos, que é a típica residência das classes médias urbanas. Nesse país, possuir um bangalô é símbolo de status.

* Fonte: Texto publicado na edição de 05 de junho de 1937 do jornal Folha de Patos com o título “É Necessário”, do arquivo do Laboratório de Ensino, Pesquisa e Extensão de História (LEPH) do Unipam.

* Foto: Do livro Domínio de Pecuários e Enxadachins, de Geraldo Fonseca.

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