JEQUITIBÁ TOMBADO…

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TEXTO: ZAMA MACIEL (1941)

Certa vez, e já lá vai por vários anos, Marcolino de Barros, em um dos rasgos de sua tão característica vivacidade, examinando os homens militantes na política municipal de então, dizia em roda íntima: “No Areado, teremos quase unanimidade, e, enquanto o Augusto viver, lá poderemos ficar tranqüilos”.

E o admirável “causeur” que ainda, nesse tempo, gostava das imagens elegantes, acrescentava: “Ao Augusto, podemos aplicar a frase de Gastão da Cunha, referindo-se ao Bias velho de Barbacena: É como um jequitibá em cuja sombra há lugar para todos”.

E agora, quando tomba este jequitibá, derrubado à pesagem dos anos, depois de ter resistido à fúria de cem tempestades, é justo que se recorde a palavra de um de seus mais íntimos amigos, também já desaparecido, mas a cujo julgamento aqueles que o conheceram ainda guardam respeito e acatamento.

Augusto Porto foi, de fato, uma grande árvore isolada no vale.

Nestes jequitibás frondosos que ficam a formosear os prados, constroem os seus ninhos os pássaros das matas, e à sua sombra acolhedora descansam os viajantes, dormem os animais. Tornam-se pontos de referência e o nome emprestam ao regato que corre a seus pés. Esta proeminência, na luta pela vida, é o prêmio daqueles que souberam ser fortes e destacar-se entre os demais.

No seu meio, a personalidade do velho Porto destacou-se a ponto de se isolar, como as grandes árvores do vale. O seu nome confundiu-se com o da terra em que vivia. Tornou-se sua expressão. Centralizou as opiniões em torno da sua, tal era o seu poder de auscultá-las, e orientar as vontades díspares para um mesmo objetivo. Completando-lhe a vida, já dentro da indagação histórica, constata-se que essa ascendência resultou de admiráveis golpes de energia, aliados a um intenso conhecimento da alma coletiva. Soube compreender a sua época, e, numa sociedade em formação, isolada pelos acidentes geográficos, era, não o líder à feição inglesa, mas o caudilho à feição americana. Empolgou, pelas suas atitudes de energia, um meio onde só vontade de ferro poderiam triunfar. Nele, o meio encontrou o homem e este homem dignificou-o. Ao fim da vida, simbolizou a sociedade que o cercava. Foi mesmo o retrato da paisagem. Tinha na alma a grandeza das serras, quando necessitava agir pelo bem público; no coração, a suavidade dos vales, quando a ele se chegavam os sequiosos de pão e justiça.

A sua memória perdurará entre os coevos com as características das grandes árvores isoladas… Assim, sentem os que contemplam este jequitibá tombado, ante o qual a minha pena se inclina reverente, na homenagem cívica aos grandes vultos que guiaram a minha terra, na fase difícil de sua formação.

* Fonte: Texto publicado na edição de 25 de maio de 1941 do jornal Folha de Patos, do arquivo do Laboratório de Ensino, Pesquisa e Extensão de História (LEPEH) do Unipam.

* Foto: Augusto Porto, de Patos de Minas, Meu Bem Querer, de Oliveira Mello.

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