PAULO MADAR PIVA – O GAÚCHO PIONEIRO

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Em 1975, o gaúcho Paulo Madar Piva, nascido em Passo Fundo em 05 de dezembro de 1951 e formado pela Escola de Engenharia Agronômica de sua cidade natal, chegou a Patos de Minas. Foi o pioneiro da leva de conterrâneos que aqui aportou, provocando uma verdadeira revolução no agronegócio. O trio Donaldo Amaro Teixeira, João de Deus Vieira e Manoel Mendes Nascimento (Pompéia) entrevistou o Agrônomo, entrevista esta que foi publicada na edição n.º 5 da revista A Debulha, de 15 de julho de 1980:

Como surgiu a ideia ou de quem partiu a iniciativa, desse grupo gaúcho, de se estabelecer em nossa região?

Partindo do pressuposto que no Rio Grande do Sul, a área em exploração está praticamente tomada, e no meu caso, como agrônomo, poderia continuar lá, trabalhando em outras atividades paralelas; tanto que quando me formei trabalhei no Banco do Brasil, na parte de avaliação, e, administrava a fazenda do meu pai. Mas, por outro lado, meu pai tem 5 filhos, então partindo da ideia de uma expansão maior, eu teria que sair de lá, e o caminho que se abria para nós na época, era Mato Grosso e Goiás, para onde ia o maior número de famílias. Meu pai se associou e compraram uma área grande em Goiás, na divisa com Mato Grosso. Estive por lá, mas não foi possível me fixar. Quando me casei¹, indo de Brasília para o Rio de Janeiro, passei por esta região que não conhecia e que me chamou a atenção, pela topografia e qualidade do terreno. Em João Pinheiro fui ao escritório da Emater onde procurei saber o que eles plantavam. Fui informado que era milho e feijão. Então, se dava isso, daria também soja e outros produtos. E muito posteriormente voltei e adquiri uma gleba. Fui o primeiro e trouxe comigo o Décio Bruxel, e depois vieram os outros. Hoje somos em Patos de Minas umas vinte famílias.

Na época, quanto você investiu e quanto vale esse investimento hoje?

Na época, comprei 1.600 hectares, dando um investimento de hum milhão e meio; sendo que hoje vale uns cem milhões.

Você chegou, viu, investiu e deu certo. O que pensa da mentalidade do nosso homem da terra?

Não culpo o mineiro, goiano ou qualquer outra pessoa que vive nesta região, por terem deixado tanto tempo esta região adormecida. O que estava acontecendo aqui, aconteceu há questão de 20 anos atrás lá no Rio Grande do Sul. Os imigrantes holandeses, italianos, alemães e outros de origens europeias, vieram para o sul por ser o clima mais parecido com o berço pátrio e aí aplicaram novas técnicas, espírito cooperativo trazidos de além-mar e foram bem sucedidos. O que deu certo lá, nós tentamos introduzir aqui na região.

Já que o governo diz que a agricultura é a salvação do país, por que não implantar essa tecnologia em nossa região e em todo o país?

O governo tem alguma culpa em parte. Mas havemos de concluir que, todos os programas de assentamento estão sendo feitos com o pessoal “lá de baixo”; a exemplo temos a região de Barra das Garças, Iraí de Minas, lá na Bahia, etc. O mineiro é muito imediatista. Ele não sente que deve investir para depois colher, como é o caso da lavoura. Temos aqui uma estação Experimental, que não está produzindo praticamente nada. Se fosse “lá em baixo” seria bem mais dinâmica. Não sei o que falta por aqui: se apoio, falta de liderança política. Acho importante ressaltar também, o que nos atraiu foi o projeto POLOCENTRO, onde o governo nos deu todo apoio.

Como foi a adaptação no nosso meio e o que difere de vocês “lá de baixo”?

Inicialmente houve problemas para se adaptar, pois os hábitos gaúchos são diferentes dos mineiros. Sentimos saudades dos laços familiares, festas, bailes, churrasco e das rodas de chimarrão. Hoje já nos sentimos bem enturmados e os hábitos já se aproximaram, já somos “MIÚCHOS” (metade mineiro e metade gaúcho).

O gaúcho, como o mineiro, tem a política no sangue. Quais são suas tendências políticas?

Sou apartidário. Normalmente voto na pessoa, não tenho partido nem paixão política.

O que você acha do Brizola?

Foi um grande caudilho, porém muito arrojado para a época em que foi governador do Rio Grande do Sul. É inteligente, astucioso e oportunista. Creio que a ideia da Reforma Agrária, como queria Brizola não funcionaria (local), mas se fosse processada em termos nacionais seria válida. Vemos um estado como o Projeto JARI nas mãos de um grupo multinacional, porque não ocupar então por brasileiros?

Qual a diferença do espírito empresarial do sul e o de Patos?

O gaúcho, em todas as suas iniciativas, é assim arrojado. Se tiver, por exemplo, que fazer uma indústria que tem viabilidade, ele pega e faz. Não vai consultar padrinho, o irmão, etc. Aqui o sujeito que quer fazer alguma coisa, ele ouve demais e quando vai fazer um outro já instalou. Um exemplo típico que estamos vendo é que, Uberlândia tá indo prá frente, Patrocínio e Patos prá trás.

Por quê?

Falta um maior dinamismo nas pessoas que lideram, uma maior motivação, mais bairrismo. É preciso que se vista a camisa de “PATOS”, precisa-se também um “dedo” da política para que se instale alguma coisa de vulto em nossa cidade. Potencial para isto Patos tem, pois trata-se de uma cidade polo.

O exemplo de vocês gaúchos, serviu para nós, mineiros?

Sem dúvida. Tenho visto muita gente plantar soja, trigo, etc. E, se não plantam mais é por causa das atuais restrições de crédito.

Como você vê a política do governo em relação à Agricultura?

No caso da soja acho totalmente errada. Generalizando, houve todo este fomento de “plante que o João garante”, de incentivo de novas áreas. Polocentro, todos visando dinamizar a agricultura. Mas o que ocorre hoje é que o homem do campo se vê abandonado. Falta de crédito e por outro lado a política de preços mínimos é vergonhosa, pois estou vendendo soja, praticamente ao preço que vendi o ano passado. Tomando-se por base o adubo que custava no ano passado sete mil cruzeiros a tonelada, este ano custa vinte mil cruzeiros. Acho desestimulante. No caso da lavoura atualmente com taxas de juros exorbitantes, não existindo mais carência, é praticamente impossível tocar a lavoura do cerrado, que necessita de no mínimo dois anos para se firmar.

Temos a Festa Nacional do Milho, com intuito de divulgar a nossa agropecuária, principalmente, e também atrair autoridades para reinvindicações. Vocês realizaram na região um grande investimento agrícola, então perguntamos: já foi convidado a participar da organização desta festa?

Não.

Por quê?

Em função do que produz o “grupo gaúcho” em termos agrícolas para a região. Não vejo nisso uma omissão nossa. Temos procurado por todos os meios nos entrelaçar com pessoas da cidade e não seria eu, por livre e espontânea vontade que iria me convidar para participar desta festa.

Pelo menos ser consultado na organização da parte agrícola. O que acha disto?

A FENAMILHO, como “show” é uma grande festa. Mas em termos de expressão de uma região, ela trás muito pouco. Patos tem muito mais coisas para apresentar do que é feito no parque de exposições. Este ano foi fraca a parte de gado, máquinas, etc. A preocupação maior fica por conta das duplas caipiras, dos artistas que vão dar show, das barraquinhas que vão dar renda e por outro lado acho uma falta de respeito com a população fazer a festa unicamente do “bolso” do povo. Deveria se estimular expositores de fora e procurar tirar daí o dinheiro.

Mas com a restrição de crédito; dentro desta estrutura atual, a Festa atrairia mais expositores, ou algum empreendimento?

Respondo com outra pergunta: Uberaba fez recentemente uma festa. Goiânia em realização, Patrocínio fará a festa do terneiro. Onde eles arrumaram verba?

Sabemos que você tem grandes financiamentos no Banco do Brasil. Existiu dificuldades?

Na época de nossa instalação, o Polocentro estava a todo pavor, e faltavam até candidatos para as verbas. No nosso caso, sentimos dificuldades pela falta de liderança, na área política, para acompanhar os empreendimentos que estavam se instalando aqui. Por outro lado o gerente do Banco do Brasil, sr. Renê, nos deu todo o apoio, inclusive no que toca à área governamental, em Brasília. Quando encalhava qualquer coisa, íamos diretamente no órgão competente e conseguíamos o que estávamos pretendendo. Recebemos ajuda também do sr. Antônio Paulinelli e do sr. Mário Pacini.

Vocês ficaram mais de oito horas na fila, à espera de uma solução?

É verdade. A agenda do sr. Mário Pacini estava toda tomada e fomos informados que não seríamos atendidos. Esperamos das 8 até as 18:30 horas, quando fomos atendidos.

Sabemos que você está ligado à nossa Cooperativa. O que acha do seu funcionamento? Você nos informou há pouco que numa reunião discutia-se o preço de uma panela de pressão?

Isso foi numa assembleia, onde dois associados debatiam que os preços da Cooperativa de Unaí estavam melhores. Achei isto insensato, pois era um assunto que nem contava da ordem do dia. E que uma panela de pressão é algo pequeno, se pudermos vender, tudo bem, mas não pode é faltar as coisas principais, que às vezes faltam, como rações, adubos, arames, vacinas, etc. Não podemos brigar no supérfluo, quando existe carência do principal.

Notamos que citou o exemplo da panela de pressão querendo com isso generalizar o espírito empresarial da cidade. Que acha disto?

Realmente o pessoal, às vezes, é muito acomodado e satisfeito com o que tem. Não me conformo nunca com o que tenho. Procuro sempre evoluir e fazer mais e baseado nisso acho que tem obras de vulto para serem feitas aqui e devemos deixar de lado certos problemas de ordem pessoal e familiar, brigas por pouca coisa e ter alguma coisa maior em mente para se fazer pela comunidade. Um pensamento mais positivista e não um sentimento derrotista.

Patos então é uma pedra bruta para ser lapidada e trabalhada?

Exato, deveria existir um maior senso crítico por parte de todos da cidade. A imprensa dando maior cobertura para aquilo que se faz, exigindo mais de nossos líderes. No momento que tivermos uma imprensa mais apurada, não ligada apenas e familiares e mais preparada, e possa informar em seu todo tudo aquilo que acontece, creio que Patos poderá galgar muito mais do que já é hoje. Senão vejamos, temos mão de obra farta, ótima localização, estradas asfaltadas, comunicação com o resto do mundo, boa vizinhança, matéria prima para industrializar (fosfato, calcário, caolim, etc.), topografia para mecanização, estamos próximos a grandes centros, temos rio para instalação de grandes indústrias. Poderíamos resumir tudo numa frase célebre de John F. Kennedy que dizia: “O que a Pátria pode fazer por mim?” a resposta dele era: “O que posso eu fazer pela Pátria”. Patos está na mesma posição, temos tudo, é só trabalhar e produzir para começarmos a colher os frutos.

NOTA: Paulo Madar Piva faleceu em um acidente aéreo no dia 20 de janeiro de 1984, quando se dirigia em seu avião rumo à Fazenda Ouro Verde, localizada na Chapada de São Pedro, juntamente com o filho Vinícius, dois amigos e um mecânico de máquinas agrícolas.

* 1: Maria Denise Piva.

* Fonte: Revista A Debulha, do arquivo de Dácio Pereira da Fonseca.

* Foto: Arquivo de Guilherme Piva.

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