ENCHENTES DO RIO PARANAÍBA

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7TEXTO: OSWALDO AMORIM (1978)

Ainda não foi dessa vez que o Paranaíba repetiu suas grandes cheias do passado, quando as águas subiam além do piso da ponte em arco, alagando as várzeas das margens e deixando a cidade temporariamente ilhada. Mas a enchente de agora bastou para liquidar com a perigosa convicção, alastrada entre nós, de que o rio não se encheria mais.

O Paranaíba transbordará sempre, pelos tempos afora, de acordo com o volume das chuvas caídas nas suas cabeceiras.

Infelizmente, a lição já custou caro – pelo número de pessoas atingidas, preventivamente socorridas pelo esquema montado pela Prefeitura e Batalhão, com a cooperação de várias entidades, entre elas a Casa do Cursilho e o Ginásio Poliesportivo, que abrigaram a maioria dos 76 desalojados pela enchente, que alcançou seu maior nível na segunda-feira, dia 16, e já na terça baixara sensivelmente permitindo a volta de muita gente às suas casas.

Apesar de todos os transtornos, é preciso ver que essa enchente foi modesta, em comparação com aquelas grandes inundações de outrora, quando o Paranaíba saltava do leito e invadia grandes porções das margens, sugerindo, na sua súbita grandeza, um poderoso caudal amazônico.

É preciso ver que, desta vez, apesar do transbordamento havido, o rio ficou cerca de quatro metros abaixo de suas marcas mais altas, num cálculo visual. (A propósito, seria bom que a Prefeitura e o Batalhão registrassem a marca de agora e levantassem a marca mais alta, provavelmente a própria amurada da ponte, para efeito de comparação)

É evidente, portanto, que esta enchente foi pequena em relação às grandes enchentes de antigamente, como a do Natal de 1945, quando meu tio Urias Nunes de Paula teve de atravessar o próprio piso da ponte de canoa. Entretanto, que eu saiba, foi a inundação que mais gente desalojou em toda a história da cidade.

É que antigamente, quando as enchentes eram mais constantes e a cidade mais distante do rio, ninguém fazia casa à sua beira. Só havia uma, junto à entrada da ponte.

Mais tarde, a cidade começou a avançar também para a margem do Paranaíba. O maior e o mais insensato passo nesse sentido foi a construção da Vila Operária, pela própria Administração Municipal, numa faixa alagável do rio, talvez embalada pela ingênua idéia de o Paranaíba não transbordaria mais. Idéia que, com o tempo e a contínua diminuição de suas águas, começou a ganhar força na cidade.

Quanto mais minguava o rio, mais crescia a convicção de que ele não transbordaria mais. E, com ela, o avanço para as suas barrancas. Um perigoso avanço, estimulado pela cupidez de alguns, a inconsciência de muitos e a omissão de todos.

Percebendo as terríveis consequências para a cidade, que esse avanço poderia provocar, comecei a advertir a população sobre a possibilidade de novas enchentes, através de vários artigos e numerosos pronunciamentos pela Rádio Clube de Patos. Cheguei a escrever uma série de cinco artigos, sob o título geral de “Prevenindo a Tragédia”, aqui na “Folha Diocesana”.

Mas não me limitava a prevenir sobre os riscos de futuras enchentes: propunha medidas concretas para evitá-las. Nada faraônico ou inexequível, mas algo perfeitamente realizável. A medida principal seria proibir a ocupação urbana das faixas alagáveis do rio e, de igual modo, de seus afluentes e sub-afluentes. Para isso sugeri a adoção de uma lei proibindo a construção de casas abaixo de determinada cota – alcançada pela maior enchente conhecida. Ao longo dessa cota seriam fincados marcos de cimento, para fixar, de forma clara, as fronteiras das áreas edificáveis.

Para maior garantia do cumprimento da lei e para dar à cidade uma grande área verde e de lazer, sugeri também a criação de um parque florestal, que abrangeria essas áreas e muito mais, alongando-se por vários quilômetros à montante e à jusante da cidade, nas duas margens do rio.

Se até agora não fui devidamente levado a sério, daqui para a frente é impossível que não o seja. A propósito, se essa enchente, que não foi das maiores, já provocou tantos transtornos, o que se pensar dos efeitos de uma grande inundação? Evidentemente, as consequências serão tanto mais desastrosas, quanto maior a ocupação urbana da faixa alagável do rio.

É preciso deter logo essa ocupação e, oportunamente, remover a ocupação já feita – com a ajuda do Governo Federal, que tem planos e recursos para isso.

* Fonte: Texto publicado na edição de 19 de janeiro de 1978 do jornal Folha Diocesana, com o título “E o Rio Transbordou”, do arquivo do Laboratório de Ensino, Pesquisa e Extensão de História (LEPEH) do Unipam.

* Foto: Do arquivo da Fundação Casa da Cultura do Milho, via Marialda Coury, publicada com o título “Enchente do Paranaíba em 1938” em 28 de fevereiro de 2013.

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