WULFRANO PATRÍCIO ATÉ 1996

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WULFRANOPatos ou Paris? Não concordo. Prefiro Patos!

Minhas normas e regras profissionais sempre foram simplicidade e sinceridade, uma vez que nunca deixei de lado, esquecida, a realidade de que o locutor precisa ser autêntico, sem disfarces.

Há praticamente 50 anos sua presença tem sido marcante na vida da cidade. Como começou tudo isso?

Foi há mais de 47 anos que cheguei a Patos de Minas, exatamente no dia 1.º de fevereiro de 1949, vindo de Araxá, onde durante um ano trabalhei como locutor na Rádio Imbiara. Vim atendendo a um convite que me tinha sido feito, apesar de em Araxá terem dado a mim a informação de que eu estava me dirigindo para o sertão. A região de Patos de Minas, na época, era conhecida simplesmente como sertão, como portão de entrada para a zona sertaneja do país. Cheguei e aqui encontrei, na verdade, uma cidade sem um palmo de asfalto, poeirenta, e uma estação de rádio extremamente modesta, funcionando com um transmissor muito velho, de alcance pequeno, já que tinha apenas 100 watts de potência. Embora não conhecesse nenhum morador daqui e não tivesse, em razão disso, um único amigo que pudesse ajudar-me no relacionamento com os patenses, logo fui tendo a oportunidade de tecer uma rede de sólidas amizades, de estabelecer um largo e muito rico círculo de relações, sentindo nascer e crescer em mim um enorme apego pela cidade, o que me foi muito gratificante ao longo de todos esses anos.

Seu trabalho como radialista é considerado um exemplo de profissionalismo. Que normas e regras direcionaram seu desempenho como homem de rádio?

Sinceramente, não considero que meu trabalho seja, na realidade, um exemplo de profissionalismo. Ele representa, tão somente, o desempenho modesto, mas correto, da minha obrigação, funcional que foi difícil, bem difícil no princípio. A Rádio Clube era uma emissora pequena, com poucos funcionários e muitas limitações, e apenas a partir de maio de 1949, após a inauguração do novo transmissor de um quilowatt, acontecimento comemorado alegremente com um baile realizado no salão da Chevrolet, local onde se encontra instalada a loja Mig, foi que as coisas começaram a melhorar. Mas minhas normas e regras profissionais sempre foram simplicidade e sinceridade, uma vez que nunca deixei de lado, esquecida, a realidade de que o locutor vai à casa do ouvinte e por isso precisa ser autêntico, sem disfarces, sem sofisticação, sem mudanças no seu jeito de falar, na sua entonação de voz. E eu fiz de tudo, programas diversificados, da transmissão de jogos de futebol, que acredito tenha sido eu o primeiro a fazer em Patos de Minas, acontecimentos sociais, bailes e até missas, uma presença constante através do microfone junto às pessoas que ouviam a Rádio Clube e que serviu para criar em torno do meu nome essa benquerença da população, mas obedecendo sempre às normas e regras básicas que são trabalho, dedicação, simplicidade e sinceridade.

Que conselhos poderiam ser dados aos mais novos que estão iniciando ou já exercem a atividade que você tanto dignificou?

A mais importante é a dignidade profissional, que pode ser desdobrada em vários outros mandamentos: responsabilidade no ato de usar o microfone, instrumento que encerra um poder extraordinário de indução, de formação de opinião junto aos ouvintes, além de absoluto respeito aos mesmos, à comunidade onde se vive, e dar o melhor de si para transmitir as emoções do dia-a-dia, porque a vida é um suceder de emoções, sejam elas boas ou más. É lógico que o estudo, a cultura, é essencial, porque o conhecimento impede e evita a desinformação. Isso tudo me permitiu realizar reportagens diversas e programas que se tornaram sucesso, como a Fala Patos de Minas, que era uma síntese dos acontecimentos da semana que findava, e alguns outros que permanecem até agora, como a Roda de Violeiros e o Carnê Social, hoje Café das Quatro, comandado pelo José Afonso. A dignidade profissional é tão importante que, no meu caso, só não me tornei dono da emissora porque faltou a coragem necessária. A Rádio Clube tinha uma dívida alta e renda pequena, e por isso seus proprietários colocaram-na à minha disposição. Mas, como disse, faltou-me a coragem mas sobrou-me disposição para o trabalho. Eu paguei a dívida e coloquei a empresa em absoluta ordem financeira, sem um centavo de débito, até que ela foi adquirida por um grupo do qual restou apenas o Binga, que ainda não era deputado estadual. Isso é motivo de grande orgulho e satisfação para mim.

As homenagens que a cidade vem lhe prestando são muitas e honrosas. Como você as está recebendo?

Com muita humildade, porque acho que elas são redundantes muito mais da benevolência do povo patense que propriamente um reconhecimento por méritos que não existem, pois não são nada mais que resultado de um trabalho desenvolvido ao longo de 47 anos. Pelo título de Cidadão Patense, pela vereança em quatro legislaturas, pelo Destaque do Ano, pelas homenagens prestadas por entidades como Sindical Rural de Patos de Minas, Sociedade Vicentina e outras, aqui fica registrado o meu humilde, sincero e comovido muito obrigado.

E o trabalho social em proveito dos humildes e necessitados? A resposta aos seus apelos tem correspondido?

E como tem correspondido. Que o diga o Dispensário da Sociedade Vicentina, cuja maior fonte de renda está ligada às campanhas feitas em meu programa e que se estendem pelo ano inteiro.  Que respondam os adoentados carentes, os necessitados de tratamento, que recebem alívio para suas dores e para seus males na farmácia sempre abastecida pelas sobras de remédios que os ouvintes diligentemente nos encaminham.

Alguma coisa mais poderia ser feita pela sociedade, como um todo, em proveito dos menos favorecidos?

Muita coisa. O povo de Patos de Minas é maravilhoso, mas o poder público precisa olhar com mais carinho para os carentes, para os necessitados. Todo mundo sabe que a saúde pública no Brasil é uma calamidade. O doente chega ao Hospital Regional, por exemplo, que até tem uma boa organização interna, mas cadê o médico? Ele não foi, não tem médico, e então o doente é obrigado a procurar um hospital particular, tem que pagar, e aí a gente sabe o que acontece. Também as filas nos postos de saúde são terríveis e eu acredito que um pouco de organização e boa vontade política seriam suficientes para pelo menos atenuar o problema.

Você é um batalhador em defesa do folclore patense e merecedor, por isso, de profundo respeito. Fale-nos das folias de reis.

As Folias de Reis são as meninas dos meus olhos e confesso que é com grande expectativa que aguardo a chegada do mês de janeiro, época do meu encontro com os foliões. Cheguei a apresentar 104 folias em uma campanha, 87 nesse ano corrente, e tenho um imenso prazer em saber que as emissoras das cidades vizinhas procedem hoje da mesma maneira como venho fazendo há 38 anos seguidos, inclusive valendo-se da oportunidade, também, para angariar e transferir recursos às entidades que assistem aos desamparados e desafortunados. Isso é altamente honroso e dignificante para qualquer um.

E sua vida política? Quais as intenções atuais?

Por quatro vezes fui vereador em Patos de Minas e agora sou candidato novamente. Da última vez disseram que não fui eleito porque não pedi votos. Mas agora eu vou pedir, tão logo a lei assim o permita.

Você se sente realizado como homem, como pessoa, como ser humano?

Posso dizer que sim, muito embora eu continue alimentando no meu íntimo, no fundo do meu coração, o desejo de construir um asilo modelo para velhinhos e velhinhas. Seria, vamos dizer assim, o prêmio maior da minha vida, a efetivação do meu grande sonho.

Qual a grande realização de sua vida?

Ainda está para acontecer. Caso eu consiga realizar o sonho que é o asilo para velhos, aí sim, minha vida estará completa.

Existem frustrações, desenganos, desencantos com relação a algo que poderia ter sido feito, mas não foi?

Todo mundo teve alguma frustração na vida, mas a minha me trouxe muito mais alegrias que desenganos. Ver reconhecido o meu trabalho é uma delas. Minha segunda esposa, maravilhosa, e com a qual eu vivo tão bem; meus cinco filhos, todos formados; o fato de não ter inimigos, pois nunca aprendi a não gostar de alguém. Tudo isso me alegra, me conforta e me deixa feliz.

Você sempre lutou pelo desenvolvimento da cidade. Qual sua opinião sobre a Patos de Minas de hoje e as expectativas para o amanhã?

Realmente, sempre lutei pelo progresso da cidade, e a maior das lutas foi certamente a que objetivou a vinda da Cemig para Patos de Minas, pois foi após a chegada da energia que encontramos meios de correr ao encontro de nosso destino de cidade maravilhosa, de cidade polo, de cidade líder de uma ampla e rica região. Por isso repito o que já disse em outra oportunidade: Patos ou Paris? Não concordo. Prefiro Patos!

NOTA: Wulfrano Patrício faleceu num domingo, em 20 de setembro de 1997.

* Fonte: Entrevista publicada na edição n.º 5 do jornal O Tablóide de 01 de julho de 1996, do arquivo de Fernando Kitzinger Dannemann.

* Foto: Arquivo do jornal Folha Patense.

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