PATOS DE MINAS: PASSADO OU PRESENTE?

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PATOS 1950TEXTO: NEWTON FERREIRA DA SILVA MACIEL (2014)

Com constância tenho encontrado pessoas mais idosas lamuriando os dias de hoje e elogiando os tempos remotos. Será que realmente, cerca de setenta anos atrás a vida era mesmo melhor, aqui em Patos de Minas, do que os dias atuais? Acredito que possa, em certas circunstâncias, ser verdadeira a assertiva. Todavia eu, particularmente, não gostaria de viver como antigamente. Apresento, abaixo, os meus principais argumentos:

1 – ALIMENTAÇÃO

A alimentação era muito deficiente naquele período. O povo, em geral, se alimentava basicamente de feijão com arroz, macarrão de grosso canudo, mandioca, couve colhida em casa e, também, os legumes sazonais, tais como a abóbora, jiló, quiabo, chuchu e poucas variedades mais. A venda de grãos a varejo era feita nos armazéns sem os devidos asseios, guardados em caixotes, muitas vezes sem tampas, bem como em sacos de aniagem. Frutas? Normalmente bananas, laranjas, mangas e abacates, colhidos nos quintais das residências e, olhe lá! A carne, prevalecendo a suína, era vendida em açougues com pouca higiene, motivando o aparecimento das conhecidas moscas varejeiras, pois não havia, como atualmente, a refrigeração competente.

Os refrigerantes eram pouco usados. A bebida mais popular era a cachaça. Como era farto o seu uso. Havia, ainda, o “vermouth”, bebida feita de uvas, na qual se misturava, habitualmente, a aguardente. Além destas o conhaque era muito apreciado. Posteriormente, os jovens misturavam coca-cola ao rum, acrescentavam gelo e formavam uma bebida que era denominada “Cuba libre”. A tão almejada cerveja, ainda que já existisse não era muito popular porque, além de cara, era encontrada somente nos bares ou em casa de famílias privilegiadas, devido à escassez das geladeiras.

2 – VESTUÁRIO

As roupas femininas eram feitas pelas costureiras e toda moça prendada sabia coser. A máquina de costura funcionava pela impulsão dos pés ou manualmente. Os tecidos da época, devido à precária indústria têxtil brasileira, não significavam boa qualidade. Todavia, era possível adquirir bons produtos através da importação, notadamente àqueles de seda e linho. Os homens tinham à sua disposição os alfaiates os quais, tendo em vista o pequeno tamanho da cidade, eram numerosos, com a finalidade de confeccionar seus ternos. O linho S-120, importado da Bélgica, permitia que os especialistas fizessem lindos ternos, adequados ao nosso clima quente, durante boa parte do ano. As camisas feitas pelas profissionais tinham colarinhos engomados. Também as cuecas eram fabricadas pelas costureiras especializadas. O hábito do chapéu vigorava para os homens quase obrigatoriamente. Destacava-se o chapéu de feltro, o mais elegante.

As mulheres usavam a conhecidíssima “combinação” que, em síntese, se resumia em um curto vestido, sem mangas, que caia sobre o corpo para, logo em seguida, colocar sobre ela o vestido. Era usual, posteriormente, a anágua, uma saia de baixo, quase sempre branca. Anos depois a moda estrangeira inventou o chamado Slack, isto é, calça comprida, hoje tão disseminada.

3 – ENTRETENIMENTOS

Nesta área, Patos era assaz deficiente. Realizavam-se alguns bailes em datas tradicionais, quase sempre no salão nobre do Grupo Escolar Marcolino de Barros, inclusive o carnaval. Alguns anos depois já funcionava a Sociedade Recreativa Patense e o Patos Social Clube, este localizado no andar superior do edifício São Bento, construído na esquina das ruas Olegário Maciel e Major Gote.

Os namoricos ocorriam no vaivém, também conhecido por footing. Tratava-se de um hábito interiorano quase exclusivamente para o namoro e consistia, aqui em nossa cidade, as moças se movimentarem em apenas um quarteirão, ou seja, na Rua Major Gote entre as ruas General Osório e Olegário Maciel. Ao mesmo tempo em que as garotas andavam, os rapazes ficavam, muitas vezes, parados flertando com as caminhantes. Era muito gostoso tal divertimento… Uma interessante peculiaridade que eu observava neste vaivém, era o fato de que as pessoas mais humildes adotavam o mesmo sistema galanteador, porém do outro lado da rua, pois os postes de iluminação ficavam no meio da Gote. Tratava-se de uma segregação voluntária, sem qualquer imposição. Esta separação espontânea de classes usada antigamente, seria motivo de um estudo sociológico sério?

Somente existia um cinema na ocasião, o cine Tupan (a grafia era exatamente desta forma). Esta diversão, bastante popular, predominava sobre todas as outras. As filas destinadas à compra dos ingressos eram longas, para a sessão das 19 horas ou das 21 horas, notadamente aos domingos quando se exibia um bom filme. Mais tarde foram construídos os cines Olinta, Garza e Riviera, todos desativados atualmente. Eventualmente surgiam os chamados “circos de cavalinho”, que se fixavam em terrenos baldios existentes próximos ao centro da cidade. As festinhas de aniversário quer para crianças ou adultos inexistiam. Entretanto, as visitas às residências de amigos e parentes eram imperativas. Convenientes para dar alento ao adoentado, para manifestar os pêsames pelo passamento de algum ente querido e em razão de recuperação de enfermidades.

Selma Cruz Fotografias (73)4 – SAÚDE

Quanto à saúde era a mesma tratada com deficiência como agora, sob o aspecto das pessoas de renda menor, embora o desenvolvimento da tecnologia. O meu cunhado, Doutor Geraldo de Resende Lima, médico dedicado, saia às vezes a qualquer hora do dia ou da noite para atender parturientes na região rural. Os partos, em sua grande maioria, eram efetuados sob a assistência de uma parteira e até do marido, pois não existiam meios de locomoção como hoje. Se necessário, lá ia o clínico, a cavalo, vestindo sua capa “ideal”, protetora das torrenciais chuvas de verão, aproveitando os sulcos deixados pelos caminhos denominados de “estrada de carro de bois”, as únicas existentes. O médico só era solicitado quando as dificuldades surgiam. Muitas eram as mulheres que faleciam pela falta de assistência ao dar à luz e, claro, incluídos aí os natimortos. Ás vezes eu via o doutor Geraldo chegar, visivelmente cansado, sem receber quase nada, ou aquilo que podiam pagar os lavradores: uma leitoa, frangos e até frutas. Hoje, para quem tem condições financeiras, a situação da saúde é bem diferente, principalmente graças ao desenvolvimento da medicina. Eu mesmo sou um exemplo clássico: estou vivo graças ao funcionamento vinte e quatro horas do marca-passo que me foi introduzido. Se a minha condição de saúde atual se desse há tantos anos atrás, tenho certeza, seria apenas um monte de ossos. O único hospital, que havia em Patos era o Regional Antônio Dias. Nele eram atendidas, assim como hoje, as pessoas de quaisquer poderes aquisitivos. A única tecnologia que se destacava era o aparelho de “Raios-X”, nada mais. O importante era o minucioso exame clínico, que poderia levar ao diagnóstico acertado ou não. Afinal, a medicina da ocasião, como a atual, nunca foi ciência exata.

As doenças infantis estavam sempre presentes: coqueluche, sarampo, catapora, caxumba e outras mais prejudiciais, como a paralisia infantil, crupe (difteria), meningite. Todas as crianças, bem como alguns adultos adquiriam furúnculos. Insetos parasitários sobreviviam com facilidade: piolhos, carrapatos, percevejos, barbeiros etc. É tão bom saber que nossos descendentes possuem as vacinas preventivas para tantas moléstias.

5 – ESPORTE

O único esporte popular existente há tantos anos era o futebol. Somente a URT fundada em 1939 pelos aficionados desta diversão, tendo à frente o professor Zama Maciel. Em 1949 foi fundado o Mamoré, apelidado de “sapo”. Muitas são as pessoas que ignoram o motivo deste apelido, mas a causa é simples: O campo em que os jogadores treinavam em tempos passados era um brejo o que, obviamente, se transformava, à noite, em uma verdadeira orquestra com o coaxar dos anuros (sapos, pererecas e rãs). Quando era criança acompanhava meus amigos para a caça dos preás que lá sobejavam. A arma fatal para eliminá-los era o estilingue. Eu não tinha coragem de matá-los, o que me deixava inferiorizado… Um ano depois da criação do Mamoré foi instituído o Tupi, localizado no quarteirão onde se encontra atualmente a CEMIG.

São mais de sessenta os anos em que foram construídas algumas benfeitorias do PTC (Patos Tênis Clube), então confeccionadas no governo do interventor do Estado de Minas Gerais, Benedito Valadares. Com a intenção de incentivar o esporte especializado, o governo mineiro criou estes clubes em algumas cidades de maior projeção. A frequência aqui era diminuta, limitando-se à prática da natação a garotos. Mesmo na década de 1950 não conseguíamos formar duas equipes para treinarmos basquete.

E então, você também gostaria de viver naquela época?

* Foto 1: Década de 1950, do arquivo da Fundação Casa da Cultura do Milho.

* Foto 2: Junho de 2013, de Selma Cruz Fotografias, do arquivo de Donaldo Amaro Teixeira.

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